Transtorno da personalidade borderline: o que é, sintomas e tratamento

O transtorno de personalidade borderline é caracterizado por instabilidade emocional, relacionamentos intensos, impulsividade e medo de abandono. Afeta o comportamento e as relações, causando sofrimento significativo.
Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro & Dra. Claudia Miliauskas

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Borderline

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O que é o transtorno da personalidade borderline?

O Transtorno da Personalidade Borderline (TPB) é um distúrbio mental caracterizado por um padrão persistente de instabilidade nas relações interpessoais, na autoimagem e nos afetos, além de impulsividade acentuada.

Em uma linguagem mais simples, podemos descrever o transtorno da personalidade borderline como um problema de saúde mental no qual a pessoa tem emoções muito intensas e muda de humor rapidamente. Ela tem muito medo de ser abandonada por pessoas importantes e seus relacionamentos costumam ser cheios de altos e baixos. Além disso, o paciente borderline tem uma visão instável de si mesmo e age de forma impulsiva, às vezes fazendo coisas prejudiciais como gastar muito dinheiro ou se machucar.

Neste artigo, exploraremos os principais aspectos do TPB, incluindo seus sintomas, critérios diagnósticos, características associadas e comorbidades, utilizando como base o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição (DSM-5).

Sintomas e critérios diagnósticos

O transtorno da personalidade borderline geralmente começa no início da idade adulta. De acordo com o DSM-5, para que o diagnóstico seja feito, é necessário que o indivíduo apresente um padrão persistente de instabilidade nas relações interpessoais, na autoimagem e nos afetos, além de impulsividade acentuada, que se manifesta em cinco ou mais dos seguintes critérios:

Medo de abandono (critério 1)

Os indivíduos com transtorno da personalidade borderline têm um medo muito grande de serem abandonadas, seja de verdade ou só na imaginação delas. Quando sentem ou acham que serão deixadas de lado, isso pode causar grandes mudanças na maneira como se veem, nas emoções e no comportamento.

Elas são muito sensíveis ao que acontece ao redor e pequenas separações ou mudanças nos planos podem desencadear reações intensas, como desespero ou raiva. Elas podem fazer esforços frenéticos para evitar o abandono, como implorar, clamar por atenção ou realizar atos desesperados.

Relacionamentos instáveis (critério 2)

As relações de quem tem transtorno da personalidade borderline são muito intensas e mudam rapidamente. No início, podem ver alguém como perfeito e, de repente, essa pessoa se torna completamente decepcionante. Essas mudanças ocorrem porque elas idealizam e depois se desiludem com facilidade, refletindo dificuldades em integrar aspectos positivos e negativos dos outros.

Perturbação da identidade (critério 3)

Pacientes com transtorno da personalidade borderline muitas vezes não têm uma visão clara e estável de si mesmo (instabilidade acentuada na autoimagem). Isso faz com que mudem frequentemente suas metas, valores, opiniões e até a identidade sexual, carreira e amizades. Essa falta de identidade consistente pode levar a sentimentos de vazio e confusão sobre quem realmente são.

Impulsividade (critério 4)

as pessoas com transtorno da personalidade borderline exibem impulsividade em situações potencialmente autodestrutivas, tendendo a agir impulsivamente em pelo menos duas áreas que podem ser prejudiciais, tais como:

  • Gastos financeiros excessivos.
  • Atividade sexual de risco.
  • Abuso de substâncias.
  • Dirigir imprudentemente.
  • Comer compulsivamente.

Comportamentos suicidas ou automutilação (critério 5)

Ameaças recorrentes, gestos ou tentativas de suicídio são comuns. A automutilação, como cortes ou queimaduras, pode ser uma forma de aliviar emoções intensas ou punir a si mesmo. Esses comportamentos geralmente ocorrem em resposta ao medo de abandono ou rejeição.

Instabilidade afetiva (critério 6)

As emoções são intensas e mudam rapidamente. A pessoa pode passar de um estado de euforia para tristeza profunda em poucas horas. Essas mudanças de humor podem ser desencadeadas por eventos aparentemente insignificantes.

Sentimentos crônicos de vazio (critério 7)

Há um sentimento persistente de vazio ou tédio. A pessoa pode sentir como se faltasse algo dentro de si e buscar constantemente atividades ou relacionamentos que preencham esse vazio.

Raiva inadequada e intensa (critério 8)

Expressões de raiva intensa e dificuldades em controlá-la são comuns. A pessoa pode ter explosões de fúria ou ressentimento, muitas vezes desproporcionais ao evento que as desencadeou.

Essas reações surgem especialmente quando o paciente acha que está sendo negligenciado ou abandonado pelos cuidadores ou companheiros.

Ideação paranoide e sintomas dissociativos (critério 9)

Sob estresse, especialmente relacionado ao medo de abandono, a pessoa pode apresentar pensamentos paranoides ou sintomas dissociativos temporários, como sentir-se desconectada de si mesma ou do ambiente (despersonalização ou desrealização).

Todos os nove critérios diagnósticos explicados acima são comuns em pacientes com transtorno de personalidade borderline. A prevalência de cada critério diagnóstico é a seguinte:

  • Instabilidade afetiva (95%).
  • Raiva inadequada (87%).
  • Impulsividade (81%).
  • Relacionamentos instáveis (79%).
  • Sentimentos de vazio (71%).
  • Paranoia ou dissociação (68%).
  • Distúrbio de identidade (61%).
  • Medo de abandono (60%).
  • Tendência ao suicídio ou autolesão (60%).

Características associadas ao transtorno da personalidade borderline

Pessoas com transtorno da personalidade borderline podem sabotar a si mesmas quando estão prestes a alcançar um objetivo importante, como abandonar a escola antes da formatura ou destruir um relacionamento quando ele começa a dar certo.

Em momentos de estresse, podem apresentar sintomas semelhantes à psicose, como alucinações ou distorções da imagem corporal. Elas podem se sentir mais seguras com objetos ou animais de estimação do que com pessoas. Existe um risco aumentado de suicídio, especialmente se também houver depressão ou abuso de substâncias.

É comum enfrentarem perdas de emprego, interrupção dos estudos e divórcios. Muitos têm um histórico de abuso físico ou sexual, negligência ou perda parental precoce. Transtornos como depressão, bipolaridade, abuso de substâncias, bulimia, estresse pós-traumático e TDAH são frequentemente observados junto com o transtorno da personalidade borderline, assim como outros transtornos de personalidade.

Transtornos associados

O transtorno da personalidade borderline frequentemente ocorre junto com outros transtornos mentais, como:

Tratamento

Para o tratamento inicial do transtorno de personalidade borderline, a psicoterapia é recomendada como primeira linha, sendo as opções mais comuns: terapia comportamental dialética (DBT), terapia baseada em mentalização, terapia focada em transferência, “gestão psiquiátrica adequada”, terapia cognitivo-comportamental e terapia focada em esquemas. Essas abordagens são eficazes para diferentes sintomas do TPB, embora os estudos mostrem pouca diferença em sua eficácia geral.

A terapia comportamental dialética é particularmente indicada para pacientes mais regredidos ou com comportamento autodestrutivo, pois ajuda a desenvolver habilidades para lidar com emoções intensas. Após estabilização comportamental, terapias mais focadas em insights, como a terapia baseada em mentalização, podem ser mais eficazes. O tratamento de comorbidades deve priorizar o TPB, pois sua resolução tende a melhorar condições associadas, como depressão e ansiedade. No entanto, sintomas específicos, como ataques de pânico e insônia, podem ser abordados com medicamentos seguros e intervenções comportamentais.

Pacientes com uso de substâncias requerem tratamento prioritário para a dependência. Em casos de outras comorbidades, como transtorno bipolar e transtorno de estresse pós-traumático, estas condições devem ser tratadas de acordo com a gravidade.

Avaliações frequentes da segurança do paciente são necessárias, podendo requerer níveis variados de cuidados, como hospitalização para casos de risco suicida elevado. Pacientes com ideação suicida crônica devem ser tratados com cautela, considerando os riscos de efeitos adversos da hospitalização.

Quando sintomas persistem, o tratamento farmacológico adjunto, focado em sintomas específicos, pode ser considerado, embora evidências de sua eficácia sejam limitadas. Algumas medicações, como antipsicóticos em baixa dose e estabilizadores de humor, são úteis para domínios sintomáticos como disfunções perceptuais-cognitivas, descontrole impulsivo e disfunção afetiva.

O tratamento do TPB pode ser desafiador devido às características instáveis dos relacionamentos dos pacientes e à sua frágil autoimagem, com frequentes flutuações entre idealização e desvalorização dos terapeutas. Essas características exigem uma equipe coordenada e suporte para os profissionais envolvidos, evitando a sobrecarga emocional e facilitando um cuidado integrado e eficaz.

Prognóstico

O transtorno de personalidade borderline geralmente começa na adolescência ou no início da vida adulta. Estudos mostram que o diagnóstico em adolescentes é tão confiável quanto em adultos e que, ao contrário do que se pensava antes, o TPB não é necessariamente uma condição crônica e imutável. Em um acompanhamento de longo prazo, 45% das pessoas diagnosticadas com TPB apresentaram melhora significativa ao longo dos anos.

Em um estudo com 290 pacientes, 35% não apresentavam mais os critérios do TPB após dois anos, 91% após dez anos e quase todos (99%) após 16 anos. Muitos mantiveram essa melhora por períodos prolongados, sendo que 78% ficaram sem sintomas por pelo menos oito anos. Fatores que contribuíram para uma melhora mais rápida incluíram idade jovem, bom desempenho no trabalho ou estudos, e ausência de histórico de abuso infantil, transtorno de ansiedade ou uso de substâncias na família.

Outro estudo acompanhou 175 pacientes por 10 anos e encontrou que 91% tiveram períodos de remissão, ou seja, fases de melhora em que apresentavam poucos ou nenhum sintoma de TPB. No entanto, a recuperação social e profissional (como estabilidade no trabalho e nas relações) foi mais lenta, e alguns pacientes voltaram a apresentar sintomas após a melhora inicial.

Esses estudos sugerem que o TPB pode não ser um padrão fixo e imutável de traços de personalidade, mas sim uma combinação de características que podem melhorar com o tempo, juntamente com comportamentos que aparecem em fases ou em momentos de maior estresse.


Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

Professora adjunta de Psicologia Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (FCM/UERJ). Doutorado concluído pelo Instituto de Medicina Social/UERJ, departamento de epidemiologia/saúde coletiva. Mestrado em saúde materno-infantil pela Universidade Federal Fluminense. Especialização em terapia familiar sistêmica. Residência médica em pediatria e psiquiatria.

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