Diarreia pela bactéria Escherichia coli (E.coli)

A Escherichia coli é uma bactéria presente no intestino, mas algumas cepas podem causar infecções graves, como diarreias e infecção urinária. Saiba como ocorre a contaminação, os riscos e as principais medidas de prevenção para evitar complicações.
Dr. Pedro Pinheiro
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E-coli

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O que é a E.coli?

A Escherichia coli, mais conhecida como E.coli, é uma bactéria que faz parte da flora intestinal de humanos e outros mamíferos. Isso significa que ela vive naturalmente no nosso intestino, desempenhando um papel importante no equilíbrio da microbiota intestinal. Todos os dias, eliminamos trilhões dessas bactérias pelas fezes, sem que isso cause qualquer problema à saúde.

Mas, se a E.coli é um microrganismo comum e presente em nosso corpo desde o nascimento, por que ela é frequentemente associada a doenças e surtos de infecção?

Para entender isso, primeiro é importante saber que nem todas as bactérias E.coli são iguais. Essa espécie possui diversas variedades — chamadas de cepas — e cada uma delas pode apresentar características e comportamentos diferentes.

Além disso, a presença da E.coli fora do ambiente intestinal pode ser um sinal de contaminação e risco para a saúde. Um bom exemplo disso são as análises microbiológicas feitas na água e nos alimentos para detectar coliformes fecais, um grupo de bactérias intestinais que inclui a E.coli. Se encontramos E.coli na água potável ou em alimentos prontos para consumo, isso indica que houve contaminação por fezes, aumentando o risco de transmissão de doenças.

Dito isso, há duas razões principais pelas quais a E.coli pode causar infecções:

1. Quando uma cepa inofensiva da E.coli sai do intestino e invade outras partes do corpo

Embora a maioria das cepas da E.coli não cause problemas enquanto está no intestino, elas podem se tornar patogênicas (ou seja, causar doenças) caso migrem para outras regiões do corpo.

Um dos exemplos mais comuns disso é a infecção urinária, que ocorre quando a bactéria se desloca do trato intestinal para o trato urinário. Isso acontece principalmente em mulheres, pois a uretra feminina é mais curta e está localizada próxima ao ânus, facilitando a ascensão da bactéria até a bexiga.

Além da infecção urinária, a E.coli também pode causar outras doenças quando atinge órgãos como os rins, o fígado, a vesícula biliar e até o sistema nervoso central. Algumas infecções que podem ser causadas por essa bactéria incluem pneumonia, meningite, artrite séptica e colecistite (infecção da vesícula biliar).

Neste artigo, vamos focar somente nas infecções intestinais causadas pela E. coli. Se você quiser saber mais sobre a relação entre essa bactéria e infecções urinárias, confira os seguintes artigos:

2. Quando uma cepa agressiva da E.coli contamina os alimentos e causa infecções intestinais

Além das cepas inofensivas que vivem no intestino sem causar problemas, existem cepas mais agressivas e potencialmente perigosas, que podem provocar quadros de diarreia severa e até complicações mais graves.

Essas cepas entram no organismo por meio da ingestão de alimentos ou água contaminados com fezes. As infecções intestinais causadas por E.coli podem variar de um simples desconforto digestivo até quadros graves, com diarreia sanguinolenta e risco de insuficiência renal.

Alguns alimentos de alto risco incluem vegetais crus lavados com água contaminada, carne malcozida, leite não pasteurizado e alimentos manipulados por pessoas que não higienizaram as mãos adequadamente.

Diarreias causadas pela E.coli

A bactéria Escherichia coli é conhecida por sua capacidade de provocar infecções intestinais que resultam em quadros de diarreia. No entanto, nem todas as cepas dessa bactéria têm o mesmo impacto no organismo. Algumas variedades são inofensivas, enquanto outras são agressivas e produzem toxinas que afetam diretamente o trato gastrointestinal, causando desde um leve desconforto até complicações graves.

Entre as principais cepas de E.coli associadas a infecções intestinais, destacam-se:

E.coli enteropatogênica (EPEC)

A E.coli enteropatogênica (EPEC) é uma das principais causas de diarreia em crianças pequenas, especialmente em países em desenvolvimento, onde as condições de saneamento podem ser precárias.

Essa cepa tem a capacidade de aderir firmemente às células da parede intestinal. Esse processo desencadeia uma inflamação no revestimento do intestino e prejudica a absorção de nutrientes e líquidos. Como resultado, ocorre uma diarreia aquosa, que pode levar à desidratação se não for tratada adequadamente.

Por que a cepa EPEC afeta mais crianças?

Os adultos, em geral, desenvolvem imunidade contra essa cepa ao longo da vida, especialmente se já tiveram contato prévio com a bactéria. No entanto, bebês e crianças pequenas ainda não possuem essa proteção, tornando-se mais vulneráveis à infecção.

Transmissão e prevenção da E.coli enteropatogênica

A EPEC é transmitida principalmente por meio da ingestão de água ou alimentos contaminados com fezes, o que reforça a importância de medidas preventivas, como a higienização adequada dos alimentos e o consumo de água potável.

E.coli enterotoxinogênica (ETEC)

A E.coli enterotoxinogênica (ETEC) é uma das causas mais comuns da chamada diarreia do viajante, um problema frequente entre turistas que visitam países tropicais ou em desenvolvimento, onde a qualidade da água e dos alimentos pode ser variável.

Essa cepa produz duas toxinas potentes:

  • Toxina termolábil (LT), semelhante à toxina do cólera, que provoca intensa perda de líquidos e eletrólitos.
  • Toxina termoestável (ST), que atua aumentando a secreção de fluidos pelo intestino.

O resultado da ação dessas toxinas é uma diarreia intensa e aquosa, semelhante à cólera, acompanhada de cólicas e desidratação.

Por que turistas são mais afetados?

Pessoas nativas de regiões onde essa bactéria é comum frequentemente desenvolvem imunidade ao longo da vida. No entanto, turistas de países de clima temperado, que não foram previamente expostos à bactéria, são mais propensos a desenvolver a infecção ao consumir alimentos ou bebidas contaminadas.

Prevenção

  • Evitar o consumo de água não filtrada ou não fervida.
  • Lavar bem frutas e vegetais antes do consumo.
  • Evitar alimentos crus ou de procedência duvidosa, especialmente em feiras e mercados de rua.

E.coli enteroinvasiva (EIEC)

A E.coli enteroinvasiva (EIEC) é uma cepa particularmente agressiva, com um comportamento semelhante ao da bactéria Shigella, que causa disenteria.

Diferente de outras cepas de E.coli, que permanecem na superfície intestinal, a EIEC tem a capacidade de invadir as células do revestimento do intestino grosso, provocando uma resposta inflamatória intensa. Esse processo resulta em uma diarreia grave, muitas vezes acompanhada de sangue e muco, além de sintomas como:

  • Dor abdominal intensa.
  • Febre alta.
  • Mal-estar geral.

Por que essa infecção é perigosa?

A inflamação e a destruição das células intestinais podem causar úlceras e lesões na parede do cólon, aumentando o risco de complicações como desidratação severa e septicemia.

Transmissão e prevenção

A EIEC é transmitida principalmente pela ingestão de alimentos contaminados ou contato direto com fezes infectadas. O risco de surtos é maior em ambientes de pouca higiene, como creches, asilos e locais onde há saneamento inadequado.

E.coli enterohemorrágica (EHEC)

A E.coli enterohemorrágica (EHEC) ou E.coli O157:H7 é uma das cepas mais perigosas, pois produz uma toxina altamente agressiva conhecida como toxina de Shiga. Essa toxina é responsável por um quadro clínico grave chamado colite hemorrágica, caracterizado por:

  • Diarreia sanguinolenta e persistente.
  • Dor abdominal intensa.
  • Vômitos e mal-estar.

Em alguns casos, a infecção por EHEC pode evoluir para uma complicação grave chamada síndrome hemolítica urêmica (SHU), que provoca:

Casos e surtos

A EHEC é frequentemente associada a surtos de intoxicação alimentar de grande escala. Um exemplo notável foi o surto ocorrido na Alemanha, em 2011, que resultou em mais de 500 casos e 11 mortes. Desde então, outros surtos foram registrados em diferentes países, geralmente ligados ao consumo de carne malcozida, vegetais crus contaminados ou leite não pasteurizado.

Prevenção

Para evitar infecções por EHEC, algumas medidas fundamentais incluem:

  • Cozinhar bem as carnes, especialmente carne moída, hambúrgueres e carnes de fast food.
  • Evitar leite não pasteurizado e sucos crus de origem desconhecida.
  • Lavar bem frutas e verduras, preferencialmente com hipoclorito de sódio ou solução sanitizante.
  • Higienizar corretamente as mãos após o contato com animais, principalmente em fazendas e zoológicos interativos.

Como evitar infecções intestinais causadas por E.coli

As infecções intestinais causadas por E.coli ocorrem quando a bactéria entra no organismo pela ingestão de alimentos ou água contaminados, ou pelo contato direto com fezes infectadas. Existem três principais formas de transmissão:

1. Contato direto entre pessoas

Embora menos comum, a transmissão de pessoa para pessoa pode ocorrer quando alguém infectado não higieniza as mãos adequadamente após evacuar e depois toca em objetos compartilhados ou prepara alimentos.

Esse tipo de transmissão é mais frequente em:

  • Creches e escolas, onde crianças pequenas ainda estão aprendendo hábitos de higiene.
  • Asilos, devido à fragilidade dos idosos e ao contato próximo com cuidadores.
  • Ambientes hospitalares, onde pacientes vulneráveis podem ser expostos à bactéria.

2. Contato com animais

A E. coli também pode ser transmitida por meio do contato com animais, especialmente em fazendas, onde o gado e os porcos podem carregar cepas patogênicas da bactéria em seus intestinos.

Além disso, o contato com fezes de animais infectados, seja no solo ou em águas contaminadas, pode ser uma via de transmissão, o que justifica a importância de higienizar bem as mãos após lidar com animais.

3. Consumo de alimentos contaminados

Essa é a forma mais comum de transmissão. A E.coli pode estar presente nos alimentos de diferentes maneiras:

  • Carnes mal cozidas, principalmente carne bovina moída e hambúrgueres, podem conter a bactéria se não forem cozidas em temperatura alta o suficiente para eliminá-la.
  • Vegetais e frutas crus podem ser contaminados ao serem irrigados com água poluída por fezes.
  • Leite não pasteurizado e queijos frescos podem conter E.coli se não forem processados corretamente.
  • Água contaminada, especialmente em locais sem saneamento básico adequado, é uma fonte frequente de infecção.

Dicas para prevenir a infecção intestinal por E.coli

A boa notícia é que grande parte das infecções por E. coli pode ser evitada com medidas simples de higiene e manipulação segura de alimentos. Aqui estão algumas recomendações essenciais:

Higiene pessoal e cuidados básicos:

  • Lavar as mãos regularmente com água e sabão, especialmente após usar o banheiro, antes de preparar alimentos e após manusear carne crua (leia: Por que lavar as mãos é importante para saúde?).
  • Evitar compartilhar talheres, copos e outros utensílios de cozinha com pessoas que estejam com sintomas de infecção intestinal.
  • Higienizar bem as mãos após contato com animais, especialmente gado e porcos.

Cuidados na manipulação e preparo dos alimentos:

  • Lavar frutas e verduras com água potável e sanitizante, como hipoclorito de sódio, para eliminar possíveis contaminantes.
  • Evitar carnes mal passadas: carne bovina, especialmente moída ou hambúrguer, deve ser cozida em temperaturas acima de 70°C para eliminar a bactéria.
  • Não consumir leite e derivados não pasteurizados, pois podem conter bactérias prejudiciais.
  • Evitar o consumo de sucos e alimentos crus de origem desconhecida.

Armazenamento e manuseio correto dos alimentos:

  • Manter alimentos refrigerados adequadamente, evitando que fiquem expostos por muito tempo em temperatura ambiente.
  • Evitar contaminação cruzada na cozinha, utilizando utensílios e tábuas diferentes para carnes cruas e alimentos prontos para consumo.
  • Lavar bem os utensílios utilizados para cortar carne crua antes de usá-los novamente.

Atenção à qualidade da água:

  • Sempre consumir água filtrada ou fervida, especialmente em locais onde a qualidade da água potável é duvidosa.
  • Evitar o consumo de gelo feito com água de procedência desconhecida, pois pode estar contaminado.

Temos um texto somente sobre as causas de diarreias que sugerimos que você leia: Diarreia | Causas, sinais de gravidade e tratamento.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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