Doenças transmitidas por água contaminada

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

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Doenças da água

Tempo de leitura estimado do artigo: 4 minutos

Quais são as doenças transmitidas pela água?

A maioria das doenças transmitidas pela água são causadas por micro-organismos presentes em reservatórios de água doce, habitualmente após contaminação dos mesmos por fezes humanas ou de animais.

A transmissão de agentes infecciosos através da água pode ocorrer pelo contato com a pele durante o banho, pela ingestão ou pela aspiração de germes presentes na água.

A forma mais comum de contaminação é através da ingestão, seja diretamente bebendo água contaminada ou pelo consumo de alimentos lavados com água infectada.

Nas regiões onde não há saneamento básico (falta de água tratada ou rede de esgoto), as doenças infecciosas podem ocorrer devido à contaminação da água de rios, lagos, córregos e, em alguns casos, até mesmo do mar por dejetos humanos e de animais. O modo mais comum de contaminação das águas é através do despejo de esgoto não tratado.

Só para se ter uma ideia, quantidades mínimas de fezes, como apenas um grama, podem conter cerca de 10 milhões de vírus, 1 milhão de bactérias ou até 1000 parasitas.

Além das infecções transmitidas diretamente pela água, há também outras doenças relacionadas à água, como infecções causadas por mosquitos que se reproduzem em água doce parada, nomeadamente denguefebre chikungunya e febre amarela. Como estas não são doenças transmitidas diretamente por água contaminada, elas não serão citadas neste artigo.

O consumo de água contaminada por substâncias químicas, como chumbo, arsênico e flúor, também pode levar a doenças.

Neste texto vamos fazer uma rápida revisão sobre as principais doenças causadas por água contaminada com germes. Se você quiser saber mais detalhes sobre as doenças citadas neste texto, utilize os links fornecidos para acessar os artigos específicos sobre cada uma.

Para saber a importância de lavar as mãos na prevenção de doenças, leia: A importância de lavar as mãos..

Doenças infecciosas transmitidas pela água

Hepatite A

A hepatite A é uma infecção viral transmitida pela via fecal-oral, ou seja, a pessoa precisa ter contato com fezes humanas contaminadas para se contaminar.

A transmissão do vírus da hepatite A pode se dar através da contaminação de alimentos preparados por pessoas infectadas que não lavam as mãos após evacuarem ou pelo contato das fezes contaminada com águas, nos locais onde não há saneamento básico. Praias, rios e lagos que recebem esgoto não tratado podem ter suas águas contaminadas com o vírus da hepatite A.

A hepatite A apresenta-se habitualmente como um quadro de diarreia, associada à perda de apetite, náuseas, vômitos, fraqueza, dor muscular, dor de cabeça e febre. Após uma semana surge a icterícia, sintoma clássico da hepatite A aguda, que se caracteriza por pele e olhos amarelados (leia: O que é icterícia?).

Para saber mais detalhes sobre a hepatite A, leia Hepatite A | Sintomas, tratamento e vacina.

Cólera

A cólera é uma infecção causada pela bactéria Vibrio cholerae e se caracteriza por um severo quadro de diarreia aquosa, que pode levar rapidamente à grave desidratação.

A cólera também é transmitida pela via fecal-oral, podendo ser adquirida através da água e de alimentos contaminados. O Vibrio cholerae, após ser ingerido, instala-se no intestino e passa a produzir uma toxina que ataca as células intestinais, provocando uma grave diarreia.

Para saber mais detalhes sobre a cólera, leia: Cólera – Sintomas, Causas e Tratamento.

Diarreia infecciosa

Além da cólera e da hepatite A, vários outros germes, incluindo bactérias, vírus e parasitas, podem contaminar águas e os seres humanos que entram em contato com as mesmas.

Alguns exemplos:

Bactérias:

  • Escherichia coli.
  • Salmonella.
  • Shigella.
  • Campylobacter pylori.
  • Chlamydia trachomatis.
  • Yersinia enterocolítica.
  • Vibrio vulnificus.

Vírus:

  • Rotavírus.
  • Norovírus (chamado antigamente de vírus Norwalk).
  • Adenovírus.
  • Sapovírus.
  • Astrovírus.
  • Adenovírus entérico.
  • Pólio.
  • Hepatitis E.

Leia: VIROSE GASTROINTESTINAL – Gastroenterite viral

Parasitas:

Para saber mais sobre diarreia e suas causas, leia: Diarreia | Sinais de gravidade

Leptospirose

A principal fonte de transmissão da leptospirose são os ratos de esgoto. A infecção pode ocorrer após o consumo de líquidos e alimentos, mas a via principal é pelo contato direto da pele com água contaminados pela urina destes roedores. O risco de transmissão é grande durante as enchentes, quando as águas contaminadas dos esgotos se misturam com o excesso de água das chuvas. Quanto mais prolongado for o contato da pele com a água contaminada pela urina de rato, maior é o risco de contágio.

Mais de 75% dos pacientes apresentam febre alta com calafrios, dor de cabeça e dor muscular. 50% apresentam náuseas, vômitos e diarreia. Um achado típico da leptospirose são os olhos acentuadamente avermelhados.

Para saber mais sobre a leptospirose, leia: Leptospirose – Sintomas e tratamento.

Esquistossomose

A esquistossomose, também conhecida por barriga d’água ou doença do caramujo, é uma infecção causada pelo parasita Schistosoma, que vive em águas contaminadas por fezes e povoadas pelo caramujo.

A esquistossomose pode ser adquirida através da ingestão de água contaminada, mas sua principal via é através da pele em pessoas que se banham em águas contaminadas pelo parasita.

A esquistossomose pode causar  grave doença do intestino e do fígado.

Para saber detalhes sobre a esquistossomose, leia: Esquistossomose – Sintomas, Ciclo e Tratamento.

Otite externa

Exposição do ouvido à água é um fator de risco bem conhecido para otite externa (inflamação da região mais externa do ouvido). A otite externa é também conhecida como “otite do nadador”.

O excesso de umidade leva à maceração da pele e à quebra da barreira de cerume, mudando a microflora do canal do ouvido, o que favorece o crescimento de bactérias que causam a otite.  A otite pode ser causada por bactérias ou fungos, e águas com elevado grau de contaminação aumentam ainda mais o risco de lesão do ouvido. Porém, a otite pode surgir mesmo em pessoas que só frequentam piscinas com adequado tratamento da água.

Para saber mais sobre a otite externa, leia: Otite externa.

Legionelose (doença dos legionários)

A legionelose, também conhecida como doença dos legionários, é uma infecção provocada por uma bactéria chamada Legionella pneumophila. A legionelose é uma infecção pulmonar que costuma ser adquirida através da inalação de partículas água contaminadas com a bactéria Legionella.

A legionelose não é transmitida de pessoa para pessoa nem é adquirida pelo consumo de água contaminada. Para adquirir a Legionella é preciso aspirar partículas de água contaminada presentes no ambiente.

Diversos tipos de sistema de água já foram identificados como potenciais fontes de legionelose. Entre os mais comuns estão sistemas de aquecimento ou arrefecimento de água, ares-condicionados centrais, banheiras de hidromassagem, chuveiros, equipamentos de água sob alta pressão, umidificadores, chafarizes, fontes artificiais, nebulizadores, saunas a vapor, etc. Qualquer ambiente onde haja vaporização ou emissão de partículas de água pode ser uma fonte de contágio, caso a água esteja contaminada com a bactéria.

Para saber detalhes sobre a legionelose, leia: Legionelose – Doença do Legionário.

O que são os coliformes fecais?

Coliformes fecais, também chamados de coliformes termotolerantes, são um grupo de bactérias que estão presentes em grandes quantidades no intestino do homem e de animais de sangue quente. Alguns coliformes termotolerantes também podem ser encontrados naturalmente em solo não contaminado por fezes.

Exemplos de coliformes termotolerantes são Citrobacter, Enterobacter, Escherichia e Klebsiella.

Geralmente chamamos de coliformes fecais os coliformes termotolerantes que estão presentes nas fezes humanas ou de animais. O principal é a Escherichia coli, mas também são considerados coliformes fecais Clostridium perfringens e os enterococos fecais (E. faecalis, E.faecium, E.durans e E.hirae).

A presença de coliformes fecais na água, principalmente a bactéria Escherichia coli (E.coli), costuma indicar contaminação fecal. O tipo de E.coli pesquisado não é perigoso para saúde, mas a sua presença é um marcador de contaminação da água, habitualmente por esgoto doméstico ou por excrementos de animais.

Águas contaminadas com coliformes fecais apresentam elevado risco de também conterem diversos outros micro-organismos patogênicos, como outras bactérias, vírus e protozoários. Desta forma, a pesquisa de coliformes fecais é recomendada para o controle da qualidade da água que consumimos, nas praias, rios e lagos e de sistemas de abastecimento de água.

Os resultados dos testes são expressos em número mais provável (NMP) de coliformes por 100 ml de amostra de água. Para a água ser considerada limpa e apta para consumo, não devemos encontrar nenhuma unidade formadora de colônia de Escherichia coli em amostra de 100 ml. A ausência de E.coli é evidência de uma água bacteriologicamente potável.

Os critérios e o grau de exigência da qualidade dos diferentes tipos de água estão resumidos abaixo:

  • Água destinada ao consumo humano fornecida por redes de distribuição, por um camião ou navios-cisterna: 0 NMP/100 ml de água analisada.
  • Águas posta à venda em garrafas ou outros recipientes: 0 NMP/250 ml de água analisada.
  • Águas balneares (águas doces, correntes ou paradas, ou águas do mar): recomendado: 100 NMP/100 ml; máximo aceitável: 2000 NMP/100 ml.
  • Águas de piscinas e outros recintos com diversões aquáticas: 0 NMP/100 ml de água analisada.
  • Águas destinadas à rega: 100 NMP/100 ml de água analisada.

Explicamos com detalhes os diversos tipos de E.coli no artigo: Diarreia pela bactéria Escherichia coli (E.coli).


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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