O que é delirium?
O delirium, também chamado de estado confusional agudo, é uma perturbação grave da função mental, caracterizado por distúrbios da consciência, com reduzida capacidade de concentração, alterações da memória, confusão mental e alteração da percepção do ambiente.
O início do quadro de delirium é geralmente súbito, evoluindo dentro de horas ou alguns dias, e são extremamente comuns em idosos, principalmente durante infecções ou internação hospitalar.
Delirium é diferente de delírio
Apesar de terem nomes muito semelhantes, delirium e delírio são coisas diferentes.
O delírio é um sintoma de doença psiquiátrica, habitualmente transtornos psicóticos; é uma crença ou uma forte convicção sobre fatos absurdos, que vão contra a razão. Como exemplo, podemos citar aquelas pessoas que se julgam a reencarnação de Jesus Cristo, que afirmam terem sido abduzidas por alienígenas, que acham que a televisão conversa com elas ou que juram que alguém implantou um chip dentro do seu cérebro para vigiar seus pensamentos.
É importante separar charlatões de pessoas com delírio real. O paciente com delírio realmente acredita no absurdo que está relatando, e por mais que você use argumentos válidos, nunca o convencerá de que seu delírio não é real. O charlatão, por sua vez, é uma pessoa desonesta, que inventa histórias conscientemente para obter vantagens, geralmente de origem financeira.
Este artigo, porém, não é sobre delírio, mas sim delirium. Sigamos em frente.
Sintomas
O delirium é bem diferente do delírio. O paciente com delirium fica confuso e desorientado, tanto temporalmente quanto espacialmente, tendo dificuldades de saber onde está e de reconhecer a atual data (quando questionado em que ano estamos, ele pode responder algo como 1958). O paciente com delirium pode estar mais sonolento e com discurso letárgico.
Há uma perda na capacidade de concentração, fazendo que o paciente não consiga prestar atenção por muito tempo em nada. Isto é evidente quando se tenta conversar com o paciente, pois o mesmo distrai-se facilmente, não conseguindo manter uma conversação. Alterações da memória recente também são comuns, fazendo com que o paciente não consiga se lembrar de situações que ocorreram há poucas horas ou dias.
Distúrbios de percepção são comuns. Os pacientes podem não reconhecer o seu médico ou familiares. Episódios de delírio podem ocorrer durante o delirium, como imaginar que está sendo perseguido ou que a equipe médica quer lhe fazer mal. Pode haver alucinações simples, com sombras ou formas; ou complexas, como ver pessoas que não existem ou que já morreram. As alucinações podem ser visuais e/ou auditivas.
Durante o delirium, os pacientes podem perder a capacidade de escrever ou falar uma segunda língua. Um estrangeiro que vive há anos no Brasil pode perder a capacidade de falar português durante o estado confusional.
O delirium surge de modo súbito e desenvolve-se ao longo de poucas horas, podendo persistir por dias ou meses. O fato de surgir subitamente é a característica mais útil na distinção com a demência, que é um quadro de instalação lenta e progressiva.
Além disso, o delirium é flutuante, tornando-se mais intenso durante a tarde e a noite. Não é incomum um paciente com delirium parecer relativamente lúcido durante as visitas matinais, ficando mais confuso conforme o dia passa. A troca do dia pela noite também é típico do delirium. O paciente fica acordado e agitado durante toda noite e passa boa parte do dia dormindo.
Ao contrário da demência, o delirium é transitório e melhora com o passar do tempo.
Causas
Não se sabe exatamente por que surge o delirium, mas o fato é que ele parece ser uma doença de origem multifatorial. O paciente que desenvolve estados confusionais costuma apresentar mais de um dos fatores de risco listados abaixo:
- Doença neurológica prévia, como doença de Parkinson, mal de Alzheimer ou AVC.
- Idade avançada.
- Internação hospitalar prolongada.
- Uso de vários medicamentos, principalmente sedativos, ansiolíticos, antidepressivos ou antipsicóticos.
- Infecções.
- Desidratação.
- Deficiência visual ou auditiva.
- Doenças crônicas em estágio avançado.
- Abstinência de álcool ou drogas.
- Pouca mobilidade, estar restrito à cama.
- Privação do sono.
- Estresse emocional.
- Dor.
- Uso prolongado de sonda vesical.
Estado confusional em pacientes internados
O delirium pode surgir em qualquer idade e em qualquer tipo de pessoa. Porém, o mais habitual é ele aparecer em idosos que estão internados em hospitais ou em lares da terceira idade. Até metade dos idosos que permanecem internados desenvolvem algum grau de confusão mental.
Se o paciente já possui alguma doença neurológica, ou se a internação foi motivada por alguma infecção, como pneumonia ou infecção urinária, o risco de delirium é altíssimo. Quanto mais debilitado estiver o paciente, maior é o risco de desenvolver confusão mental.
O paciente internado, além de obviamente estar doente, o que por si só é um fator de risco para o delirium, sai completamente da sua rotina, perde a noção do tempo, muitas vezes não acompanha o ciclo dia-noite, usa diversos medicamentos e costuma ficar a maior parte do tempo, quando não todo o tempo, restrito ao leito do quarto.
A internação hospitalar geralmente é um momento em que vários fatores de risco para o desenvolvimento de um estado confusional estão presentes, tornado o delirium uma situação extremamente comum.
Quando um paciente idoso em bom estado desenvolve delirium em casa, geralmente há alguma causa oculta por trás. Idosos costumam reagir de modo diferente às infecções. Muitos não apresentam febre e podem não ter queixas muito específicas. O aparecimento de delirium pode ser a única dica para um quadro infeccioso em curso, como infecção urinária ou pneumonia.
Prevenção e tratamento
Não existe tratamento específico para o delirium. O tratamento deve ser direcionado à doença ou à condição que está precipitando o estado confusional. Porém, mais importante do que tratar o delirium, é tentar prevenir o seu aparecimento. Para isso, deve-se:
- Evitar manter o paciente internado por longos períodos.
- Controlar adequadamente a dor.
- Evitar uso excessivo de medicamentos.
- Evitar uso prolongado de cateteres e sondas.
- Estimular o paciente a não ficar restrito ao leito.
- Tratar infecções em tempo hábil.
Se o paciente estiver confuso e muito agitado, o uso de drogas para acalmá-lo e controlar a agitação podem ser necessárias. Em casos extremos, o paciente pode ficar contido ao leito, principalmente se o mesmo estiver sob risco de queda da cama ou tentando arrancar soros e medicações feitas por via venosa.
Delirium tremens
O delirium tremens é uma condição definida por alucinações, desorientação, hipertensão, taquicardia (aceleração dos batimentos cardíacos), febre, agitação e sudorese provocados pela abstinência a drogas, mais comumente ao álcool.
O delirium tremens é uma emergência médica e pode evoluir para colapso cardiovascular ou insuficiência respiratória se não tratado a tempo.
Os quadro de abstinência leve ocorrem dentro de 6-24 horas após a última bebida, sendo caracterizados por tremores, ansiedade, náuseas, vômitos e insônia. Os quadros de abstinência alcoólica grave ocorrem 10-72 horas após a última bebida.
Os sinais e sintomas incluem alucinações visuais e auditivas, tremores do corpo inteiro, vômitos, sudorese e hipertensão. Crise convulsiva também pode ocorrer.
Aproximadamente 5% dos pacientes alcoólatras que suspendem, voluntariamente ou involuntariamente, o consumo de álcool sofrem de delirium tremens. O quadro costuma durar de um a cinco dias e a internação hospitalar costuma estar indicado para controle da situação.
Referências
- Diagnosis of delirium and confusional states – UpToDate.
- Delirium and acute confusional states: Prevention, treatment, and prognosis – UpToDate.
- Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, 5ª edição – DSM-5 – American Psychiatric Association.
- Delirium in elderly adults: diagnosis, prevention and treatment – Nature reviews. Neurology.
- Adams RD, Victor M, Ropper AH. Delirium and other acute confusional states. In: Principles of Neurology, 6th, McGraw-Hill, New York 1997.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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