O que é derrame pleural?
O derrame pleural, popularmente conhecido como “água na pleura” ou “água no pulmão”, é o nome dado ao acúmulo anormal de líquidos na pleura, uma fina membrana que envolve o pulmão.
O derrame pleural não é uma doença em si, mas sim uma manifestação comum de várias doenças diferentes. Sendo assim, uma vez diagnosticada a presença de derrame pleural, o próximo passo é investigar a sua causa.
Neste texto abordaremos as causas, sintomas, formas de diagnóstico e opções de tratamento do derrame pleural.
O que é a pleura?
Assim como a meninge é a membrana que envolve o cérebro e o pericárdio é a membrana que envolve o coração, a pleura é o nome dado à membrana que envolve os pulmões.
Nota: dizer pleura do pulmão é um pleonasmo já que não existe nenhuma outra pleura, a não ser aquela que envolve o pulmão. O termo correto é simplesmente pleura.
A pleura é composta por duas camadas, a pleura visceral, que é a camada interior e fica colada ao pulmão, e a pleura parietal, camada mais externa que fica em contato com as estruturas anatômicas ao redor dos pulmões.
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Entre as duas camadas de pleura existe um espaço mínimo, de 20 micrômetros (0,02 milímetro), chamado de cavidade pleural, ou espaço pleural. Dentro dele encontra-se uma pequeníssima lâmina de líquido, que faz papel de lubrificante, impedindo o atrito entre as duas camadas de pleura quando os pulmões se enchem e quando se esvaziam de ar. Este líquido recebe o óbvio nome de líquido pleural.
O volume normal de líquido dentro da cavidade pleural é de aproximadamente 0,2 ml por kg de peso, ou seja, algo em torno de 12 ml em um indivíduo de 60 kg.
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A pleura é altamente vascularizada e o seu líquido é constantemente renovado a uma taxa de 0,6ml/h. Os microvasos sanguíneos e linfáticos que irrigam a pleura são os responsáveis por trazer e levar o líquido pleural, mantendo sempre um volume constante dentro da cavidade. Quando há uma perturbação deste balanço, começa a haver retenção de líquidos no espaço pleural e o derrame se forma.
Tipos e causas de derrame pleural
O derrame pleural é dividido basicamente em dois tipos, sendo esta distinção importante para o estabelecimento da causa.
Transudato
O líquido pleural transudativo é claro e transparente, sem células, com baixa concentração de proteínas, indicando um acúmulo de um líquido semelhante ao líquido pleural normal.
O derrame pleural que se manifesta com líquido tipo transudato é normalmente causado por:
- Insuficiência cardíaca.
- Cirrose.
- Síndrome nefrótica.
- Insuficiência renal avançada.
- Hipotireoidismo descompensado.
- Diálise peritoneal.
Em geral, qualquer doença que evolua com ascite pode também cursar com derrame pleural, pois há comunicação entre a cavidade abdominal e o tórax.
Exsudato
O líquido pleural exsudativo é rico em proteínas e células inflamatórias, tem aparência mais viscosa e opaca, por vezes, com sinais de sangue misturado, podendo nos casos de infecções se apresentar tipicamente como uma coleção de pus.
O derrame pleural que se manifesta com um líquido tipo exsudato, ocorre normalmente por inflamação da pleura, podendo ser causado por vários grupos diferentes de doenças, incluindo infecções, doenças sistêmicas e cânceres. As doenças mais comuns que causam derrame pleural exsudativo são:
- Pneumonia.
- Tuberculose.
- Cânceres com metástases para a pleura.
- Mesotelioma.
- Linfoma.
- Embolia pulmonar.
- Lúpus.
- Artrite reumatoide.
- Outras doenças autoimunes.
- Pancreatite.
- Complicações intra-abdominais, como peritonites ou abscesso.
- Síndrome de hiperestimulação ovariana.
- Radioterapia.
A distinção entre exsudato e transudato é feita através da dosagem de proteínas no líquido, explicada mais abaixo.
Quando ocorre o acúmulo de um líquido francamente purulento, damos o nome de empiema pleural. Existem ainda outros tipos de líquidos que podem se acumular na pleura, tais como:
- Sangue, chamado de hemotórax, que costuma ocorrer nos traumas penetrantes do pulmão.
- Urina, chamado de urinotórax, condição rara que pode ocorrer em obstruções das vias urinária.
- Triglicerídeos e lipídeos, chamado de quilotórax, normalmente causado por obstrução dos vasos linfáticos da pleura.
Sintomas
Quanto maior for o derrame, e quanto mais rápido ele se forma, mais sintomas ele causará.
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Quando olhamos para a ilustração acima, que demonstra a compressão de um pulmão pelo excesso de líquido pleural, não é difícil entender por que o sintoma mais comum do derrame pleural é a falta de ar, chamada em medicina de dispneia.
Quando o derrame surge subitamente, a falta de ar é mais evidente. Quando ele se forma lentamente, e se associado a outras doenças que também causam falta de ar como insuficiência cardíaca, ele pode passar despercebido por algum tempo.
Alguns derrames pleurais podem ser tão volumosos quanto 4 litros, o que é suficiente para comprimir completamente o pulmão afetado.
Outro sintoma comum do derrame pleural é a dor torácica que costuma ocorrer quando a pleura está irritada. Esta é uma dor em pontada que se agrava toda vez que o paciente respira fundo. Este tipo de dor recebe o nome de dor pleurítica. Muitas vezes há também uma tosse seca irritativa.
A dor e a falta de ar são basicamente os dois sintomas próprios do derrame. Os outros sintomas que normalmente acompanham o quadro costumam ocorrer devido à doença de base, como febre e tosse na pneumonia, tosse com raias de sangue no câncer de pulmão, ascite na cirrose, pernas inchadas na insuficiência cardíaca, e assim por diante.
Diagnóstico
Um exame físico bem feito, com uma boa auscultação dos pulmões, é capaz de sugerir a presença do derrame pleural sempre que houver mais de 300 ml de líquido acumulado. O excesso de líquido se entrepõe ao pulmão e as costas, e os ruídos pulmonares ficam inaudíveis.
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Quando a história clínica e o exame físico sugerem a presença do derrame pleural, a confirmação pode ser feita com uma simples radiografia de tórax.
O derrame pleural se mostra como uma grande mancha branca no local onde deveria estar sendo visto apenas o pulmão cheio de ar.
Para ser detectado pela radiografia simples, o derrame pleural deve ter pelo menos 75 ml de líquido. Quando há dúvidas, uma opção é fazer outra radiografia com o paciente deitado de lado, fazendo com que o líquido escorra ao longo das costelas. Esta técnica permite diagnosticar derrames menores que 50 ml.
Exames como a tomografia computadorizada e a ultrassonografia conseguem detectar coleções de líquidos mínimas, como meros 10 ml.
Uma vez diagnosticado o derrame pleural, a não ser que a sua causa seja óbvia, como em cirróticos com grande ascite, na síndrome nefrótica descompensada ou na insuficiência cardíaca grave, o seu líquido deve ser analisado visando a determinação da sua composição.
O único jeito de se abordar o líquido pleural é através de um procedimento chamado toracocentese, que consiste na inoculação de uma agulha entre as costelas do paciente até se chegar ao espaço pleural. Normalmente colhe-se entre 50 e 100 ml do derrame.
O líquido colhido pode ser analisado de forma a se determinar a presença de exsudato ou transudato, de células cancerígenas e de bactérias.
Além da toracocentese para o diagnóstico, nos casos de derrame pleural volumoso pode-se implantar um pequeno tubo para drenagem de volumes maiores de líquido a fim de desobstruir o pulmão afetado.
As principais complicações da toracocentese são hematomas no local da punção, contaminação do derrame pleural por bactérias da pele e pneumotórax.
Se os exames acima não identificarem a causa do derrame pleural, ainda se pode realizar uma toracoscopia, com introdução de um endoscópio dentro da cavidade pleural para visualização da pleura e dos pulmões e eventual realização de uma biópsia.
Tratamento
Como foi dito no início deste texto, o derrame pleural não é uma doença em si, mas um sinal de uma doença. Portanto, a simples drenagem do líquido é apenas um procedimento paliativo, já que, se a causa não for tratada, a maior hipótese é de que o derrame se forme novamente.
O derrame pleural será resolvido assim que a doença que o está causando for controlada. Infecções são controladas com antibióticos, insuficiência renal com hemodiálise, doenças autoimunes com imunossupressores, etc.
Em algumas situações, quando a doença de base não tem tratamento efetivo, como em muitos casos de cânceres metastáticos, uma opção para se evitar a formação repetida de derrames pleurais é a esclerose da cavidade pleural. Injeta-se uma substância irritante dentro da pleura causando uma grande cicatrização da mesma e aderência dos folhetos parietal e visceral, eliminado assim, o espaço pleural.
Referências
- Pleural Effusion – U.S. National Library of Medicine (NIH).
- The management of benign non-infective pleural effusions – European Respiratory Society.
- Pleural effusion: diagnosis, treatment, and management – Open access emergency medicine.
- Mechanisms of pleural liquid accumulation in disease – UpToDate.
- Diagnostic evaluation of a pleural effusion in adults: Initial testing – UpToDate.
- Pleural Effusion – Medscape.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.