O que é goji berry?
O goji berry é um pequeno fruto obtido da planta Lycium barbarum, da família Solanacea, natural da China e de regiões do Himalaia. Também fazem parte da família Solanacea as plantas que dão origem ao tomate, à berinjela, à batata, à pimenta e ao tabaco.
A Lycium barbarum tem sido utilizada historicamente pela medicina tradicional chinesa como um tratamento para aumentar a vitalidade e a longevidade. No ocidente, porém, a planta do goji berry só ganhou popularidade na última década, com a popularização da Internet e após o seu consumo ter sido divulgado por algumas celebridades da TV, da música e do cinema.
O goji berry pode ser consumido na sua forma natural, desidratado, através de sucos, chás ou em cápsulas vendidas como suplemento alimentar.
Nesse artigo faremos uma revisão sobre as informações científicas disponíveis acerca do goji berry e da Lycium barbarum. Vamos explicar o que é mito, quais são os benefícios que têm alguma base científica, quais são os efeitos adversos já conhecidos e quais são as potenciais interações farmacológicas com outros medicamentos.
Para que supostamente serve
O goji berry é rico em nutrientes, como ferro, cálcio, fósforo, zinco, antioxidantes e vitaminas, principalmente as C, B1, B2 e B6. Isso por si só já faz dele um produto fácil de ser divulgado.
No entanto, com uma rápida pesquisa pela Internet é fácil notar que o goji berry não é tratado simplesmente como um alimento rico em nutrientes, mas sim como um super alimento, capaz de combater uma enormidade de males, que vão desde câncer até infecções, passando por doenças cardiovasculares e obesidade.
Selecionamos alguns dos alegados benefícios do goji berry que achamos em diversos websites:
- Previne diabetes.
- Aumenta a sensação de bem-estar.
- Melhora o humor.
- Protege o cérebro contra doenças neurodegenerativas.
- Previne doenças cardiovasculares.
- Tem ação anticancerígena.
- Previne o câncer.
- Protege a pele contra os raios ultravioleta.
- Melhora a visão.
- Previne o glaucoma.
- Fortalece o sistema imunológico.
- Combate a celulite.
- Ajuda a emagrecer.
- Tem ação antioxidante.
- Reduz o colesterol.
- Controla a pressão arterial.
- Combate a infertilidade.
- Ajuda na disfunção erétil.
- Previne o envelhecimento.
- Trata hepatite.
- Aumenta a expectativa de vida.
- Melhora o desempenho atlético.
- Protege os rins.
- Previne gripes e resfriados.
- Melhora asma.
Esses são apenas alguns dos alegados benefícios do goji berry. A lista completa é muito maior.
O goji berry funciona para todas essas doenças mesmo?
Se você vai levar o seu carro a uma oficina e alguém tenta vender-lhe um produto dizendo que ele serve para preservar o motor, a bateria, os amortecedores, os pneus, os freios, a direção hidráulica, os faróis e ainda ajuda a poupar combustível, deixa o ar-condicionado mais eficiente e protege a pintura externa, você obviamente vai torcer o nariz, não é? Pois na saúde você deve adotar a mesma postura crítica.
Quando um único produto é divulgado como sendo eficaz para múltiplas doenças, algumas delas com mecanismos fisiopatológicos completamente distintos, isso deve servir como um sinal de alerta. Nosso organismo é extremamente complexo para que uma única substância consiga ser capaz de tratar ou prevenir várias doenças ao mesmo tempo.
Do ponto de vista científico, só podemos dizer que uma substância é útil no tratamento ou na prevenção de alguma doença se essa mesma substância já tiver sido estudada eficientemente contra o tal problema.
Tenha em mente que muito dos sites de Internet que fazem promoção dos benefícios do goji berry não são sites com uma postura editorial científica. Na maioria dos casos, os textos não são escritos por médicos ou nutricionistas e não se baseiam em evidências científicas. Na verdade, muitos desses sites encaixam-se em uma das três categorias:
- Sites que ganham incentivos financeiros para falar bem de um determinado produto.
- Sites que vendem ou direcionam você para quem vende o produto que eles estão elogiando.
- Sites que procuram ganhar audiência e cliques elogiando produtos da moda e com grande procura no Google, pois as pessoas são muito mais receptivas a matérias positivas do que a matérias críticas.
O que a ciência diz sobre o goji berry?
O goji berry e a planta Lycium barbarum já foram objeto de vários estudos científicos, principalmente na China, país onde o produto é muito popular. Na maioria dos casos, porém, o alvo do estudo não é especificamente o fruto ou a planta, mas sim um dos seus constituintes, chamado LBP, sigla em inglês para “polissacarídeos de Lycium barbarum”.
Realmente é possível encontrar uma grande quantidade de artigos científicos sobre benefícios do LBP para diversos distúrbios diferentes, tais como inibição do crescimento de tumores, tratamento da esteatose hepática, redução da resistência à insulina, redução do colesterol, etc.
São esses estudos científicos que servem de embasamento para os alegados benefícios do goji berry. Entretanto, existem alguns problemas e informações vitais nestes estudos que costumam ser omitidos da população leiga, que não está acostumada a interpretar trabalhos científicos.
O primeiro problema é o fato do produto utilizado na maioria dos estudos ser um extrato purificado e com elevada concentração de LBP, muito acima daquela que conseguimos ingerir através do consumo do goji berry habitualmente comercializado. Nada nos garante que em doses “normais” o goji berry tenha o mesmo efeito.
Mas essa nem é a principal questão. Na imensa maioria dos trabalhos publicados, o LBP foi testado apenas invitro ou em animais. Não há ensaios clínicos relevantes em humanos. Isso pode não parecer tão importante à primeira vista, mas a maioria das substâncias que parecem ser eficazes e seguras em estudos invitro ou em animais falham ao serem estudadas em humanos. Na verdade, até 94% das substâncias que são aprovadas em animais e passam para testes clínicos em humanos acabam reprovadas, seja por falta de eficácia ou por apresentarem eventos adversos intoleráveis.
Portanto, o simples fato de uma determinada substância apresentar bons resultados em laboratório ou em animais não serve como evidência científica da sua utilidade em humanos. Para podermos dizer que determinada substância é realmente eficaz ou segura são necessários ensaios clínicos grandes, duplo-cegos e controlados em humanos. No caso do goji berry, ainda não existe esse tipo de estudo.
Os poucos estudos em humanos disponíveis até o momento são geralmente compostos por um baixo número de participantes, fornecem poucas informações clínicas ou apresentam graves defeitos no seu desenho. São estudos de má-qualidade que não permitem nenhuma conclusão. Por conseguinte, podemos dizer que as evidências científicas sobre os efeitos do goji berry são, na melhor das hipóteses, muito fracas.
Isso significa, então, que o goji berry não tem efeitos benéficos à saúde?
Não, significa apenas que não existem provas de que o goji berry sirva para tratar doenças. O goji berry é um bom alimento, assim como são todos os vegetais em geral. O problema é que há muitos charlatões ganhando dinheiro em cima de falsas alegações e propaganda enganosa.
Efeitos colaterais
Muitas pessoas equivocadamente imaginam que quando um produto é comercializado sob o rótulo de “produto natural” ele não apresenta riscos de efeitos adversos. Nada mais falso, até porque organismos diferentes podem reagir de forma distinta a um mesmo produto, que o digam os pacientes alérgicos a ovo ou a frutos-do-mar.
Assim como qualquer alimento, o goji berry pode desencadear reações alérgicas graves. Pessoas com histórico de alergia a tabaco, pêssegos, tomates ou nozes apresentam maior risco de também terem alergia ao goji berry.
Algumas pessoas apresentam quadro de náuseas e vômitos após o consumo do goji berry, porém esse efeito é incomum e costuma ocorrer apenas com doses elevadas.
Goji berry na gravidez
Como não há estudos sobre a segurança do goji berry em humanos, também são inexistentes os estudos na gravidez. Em geral, os médicos aconselham evitar o goji berry durante a gestação, pois o produto é rico em betaína, uma substância que estimula a contração uterina e pode provocar aborto ou parto prematuro. Na dúvida, o melhor é jogar pelo seguro.
O goji berry também é desaconselhado durante o aleitamento, por falta de estudos que comprovem a sua segurança para o bebê.
Interações medicamentosas
O goji berry interage com citocromo P450, que é uma via enzimática do fígado responsável pela metabolização de diversos medicamentos. Isso significa que existe uma grande variedade de medicamentos que podem sofrer alterações na sua eficácia, se o paciente estiver consumindo goji berry regularmente. Se você toma medicamentos, não comece a consumir o goji berry sem antes consultar o seu médico.
Em geral, a interação medicamentosa mais importante se dá com anticoagulantes, como heparina ou Varfarina. O goji berry aumenta o risco de hemorragia, por elevar a concentração dos anticoagulantes no sangue.
O risco de sangramento também é maior se o paciente estiver medicado com inibidores da agregação plaquetária, tais como o AAS, plavix ou clopidogrel. A associação do goji berry com o ginkgo biloba também pode aumentar o risco de hemorragia.
Pacientes diabéticos ou hipertensos que estejam medicados para estas doenças, também devem tomar precauções, pois o goji berry aumenta o risco de episódios de hipoglicemia e hipotensão.
Referências
- Goji – MedlinePlus – U.S. National Library of Medicine.
- Goji berries (Lycium barbarum): risk of allergic reactions in individuals with food allergy – Journal of investigational allergology & clinical immunology.
- Goji Berries as a Potential Natural Antioxidant Medicine: An Insight into Their Molecular Mechanisms of Action – Oxidative medicine and cellular longevity.
- Possible interaction between warfarin and Lycium barbarum L – The Annals of pharmacotherapy.
- Goji berries – U.S. Department of Agriculture.
- A Systematic Review of Potential Therapeutic Use of Lycium Barbarum Polysaccharides in Disease – BioMed Research International.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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