Carambola faz mal para rins e cérebro?

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro & Dra. Renata Campos

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Carambola faz mal

Tempo de leitura estimado do artigo: 4 minutos

O que é a carambola?

A carambola (Averrhoa carambola) é uma fruta bastante popular nos países de clima tropical e subtropical. O seu consumo se dá não só através da própria fruta ou do seu suco, mas também através de chás, extratos, concentrados e ervas medicinais.

A divulgação da carambola como medicamento natural é especialmente problemática, porque a fruta é reconhecidamente perigosa para pacientes com doenças renais e até para pessoas saudáveis, caso seja consumida em excesso.

Não há evidências científicas de que a carambola seja útil como tratamento para qualquer doença, mas já há ampla literatura sobre os riscos de intoxicação pela fruta.

Neste artigo explicaremos quais são os perigos da carambola, os seus sintomas de intoxicação e quais grupos devem evitar o seu consumo.

Por que a carambola pode fazer mal?

Desde a década de 1990 foram publicados dezenas de casos de pacientes com insuficiência renal que apresentavam sintomas neurológicos de início súbito após o consumo de carambola.

Os pacientes com sintomas de intoxicação pela fruta apresentavam desde soluços intratáveis até fraqueza muscular, agitação ou crises convulsivas. A mortalidade nesses pacientes intoxicados chega a ser de 20 a 40%, mesmo quando submetidos a tratamento intensivo.

A carambola é perigosa porque possui uma neurotoxina poderosa, chamada caramboxina, que é um aminoácido semelhante à fenilalanina. A caramboxina age no sistema nervoso central provocando uma hiperexcitabilidade do cérebro, motivo pelo qual muitos pacientes ficam agitados e podem até ter convulsões.

A carambola é especialmente problemática para os pacientes com insuficiência renal porque a caramboxina costuma ser eliminada do organismo pelos rins através da urina. Não é de se estranhar, portanto, que pessoas com disfunção renal estejam mais propensas a acumular essa neurotoxina no sangue e a desenvolver sintomas de intoxicação.

É sempre bom lembrar que a insuficiência renal crônica é uma doença silenciosa. Nem todo mundo que é doente dos rins sabe que tem o problema. Estima-se que existam mais de 2 milhões de pessoas no Brasil com graus diferentes de doença renal crônica. Relevante parte desses pacientes não apresenta nenhum sintoma. Somente através da dosagem sanguínea da creatinina é que é possível identificar a insuficiência renal nos pacientes assintomáticos.

Idosos, hipertensos, diabéticos, pacientes que fazem uso frequente de anti-inflamatórios, portadores de doença renal policística e pacientes com cálculo renal de repetição fazem parte do grupo de risco e podem ter algum grau de falência renal sem nem ao menos suspeitarem.

Mas o perigo da carambola não está restrito apenas aos pacientes com insuficiência renal. Nos últimos anos têm sido descritos cada vez mais casos de intoxicação pela carambola em pacientes previamente saudáveis e jovens. Esses casos estão geralmente associados a um grande consumo da fruta, mas em pelo menos um paciente, a quantidade consumida havia sido apenas 1 copo de 300 ml de suco puro.

Os pacientes saudáveis que se intoxicam pela carambola costumam apresentar, além dos sintomas neurológicos, também quadros de insuficiência renal aguda provocados pela deposição renal de cristais de oxalato, um tipo sal presente em grande quantidade na carambola.

A nefropatia por oxalato é uma conhecida causa de insuficiência renal, que não é exclusiva dos pacientes com intoxicação por carambola.

Portanto, o mecanismo de intoxicação pela carambola em pessoas saudáveis costuma seguir o seguinte padrão:

Consumo exagerado de carambola → Deposição de oxalato nos rins → Insuficiência renal secundária à nefropatia por oxalato → Acúmulo de caramboxina no sangue → Intoxicação neurológica.

Quantidade tóxica

O consumo de carambola em pacientes com insuficiência renal é terminantemente proibido. Há casos graves de intoxicação descritos após o consumo de apenas 200 ml de suco ou menos da metade de uma fruta. Nos pacientes com disfunção renal grave em tratamento com hemodiálise, mesmo pequenas quantidades de carambola podem ser fatais.

Em relação aos pacientes saudáveis, sem disfunção renal prévia, ainda não temos bem definido quais são os limites de segurança. Os casos descritos de lesão renal aguda pela carambola geralmente estão associados a um consumo exagerado da fruta, como a ingestão de mais de 5 a 10 peças de fruta ou de pelo menos 0,5 a 1 litro do suco em um intervalo de 12 a 24 horas.

Um dos casos descritos na Índia foi de um jovem de 29 anos, previamente saudável, que após intenso trabalho resolveu se hidratar tomando 1 litro de suco de carambola. Doze horas depois do consumo da fruta, ele desenvolveu quadro de intoxicação com insuficiência renal aguda por deposição de oxalato nos túbulos renais, sendo necessário tratamento com hemodiálise. Felizmente, o paciente se recuperou totalmente.

Além da desidratação, outro fator que parece aumentar o risco da toxicidade pela carambola em pessoas saudáveis é o consumo da fruta em jejum.

Sintomas da intoxicação

O primeiro sintoma da intoxicação pela carambola costuma ser um quadro de soluço, que é persistente e não responde a nenhuma das formas de tratamento habituais (leia: Como parar o soluço). Os soluços surgem habitualmente de 1 a 4 horas após o consumo da fruta, mas há casos em que o intervalo de tempo é de até 24 horas.

Após os soluços, os sintomas que costumam surgir, não necessariamente nessa ordem, são:

  • Vômitos.
  • Dor lombar.
  • Fraqueza muscular.
  • Formigamento e perda da sensibilidade nos membros.
  • Insônia.
  • Agitação psicomotora.
  • Confusão mental.
  • Crise convulsiva
  • Hipotensão arterial.
  • Insuficiência respiratória
  • Coma
  • Morte.

Diagnóstico

O diagnóstico da intoxicação pela caramboxina é relativamente fácil em pacientes com insuficiência renal, que apresentam soluços incoercíveis e relatam consumo recente de carambola para o seu médico nefrologista.

Por outro lado, o diagnóstico é muito difícil nos pacientes que chegam ao médico já em estágios avançados de intoxicação, com convulsões, fraqueza muscular ou coma.

A maioria dos médicos pensa primeiro em AVC ou em outras causas de intoxicação, pois a toxicidade da carambola não é muito conhecida entre os médicos que não são nefrologistas ou neurologistas. Se o paciente ou os familiares não referirem o consumo de carambola, é pouco provável que o médico vá pensar inicialmente nessa hipótese.

Tratamento

O único tratamento efetivo, até o momento, para a intoxicação por carambola é a hemodiálise, que deve ser realizada com sessões diárias. Mesmo os pacientes que previamente eram saudáveis devem ser tratados com hemodiálise, caso apresentem sinais neurológicos de intoxicação pela caramboxina (leitura sugerida: Hemodiálise: o que é, para que serve e como se faz).

Os casos de intoxicação leve costumam melhorar após 2 ou 3 sessões de hemodiálise, enquanto os pacientes mais graves costumam precisar de pelo menos 7 dias seguidos de tratamento. E mesmo com tratamento, alguns pacientes acabam evoluindo para o óbito.

Conclusões

  • Indivíduos com disfunção renal estão proibidos de consumir carambola. Quanto mais grave for a disfunção renal, maior é o risco de intoxicação fatal, mesmo com pequenas quantidades da fruta.
  • Indivíduos saudáveis devem evitar o consumo de carambola em grandes quantidades ou sob a forma de extratos ou concentrados. Nesse grupo, a intoxicação é rara, mas pode ocorrer se o consumo for exagerado, como mais de 5 peças por dia ou mais de 500 ml de suco.
  • Evite consumir carambola em jejum ou se estiver desidratado.
  • A intoxicação por carambola é provavelmente mais comum do que se imagina, mas boa parte dos casos não é reconhecida.
  • O surgimento de soluço persistente após o consumo de carambola é um sinal muito sugestivo de intoxicação. Qualquer um nessa situação deve procurar rapidamente apoio médico.

Referências


Autor(es)

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

Médica graduada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Universidade do Porto. Nefrologista pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e pelo Colégio de Nefrologia de Portugal.

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