O que é uma paralisia facial?
Chamamos de paralisia facial quando existe uma perda de controle de todos ou alguns músculos responsáveis pelos movimentos da face e pelas expressões faciais.
A paralisia facial é um problema relativamente comum que envolve a paralisia de qualquer estrutura inervada pelo nervo facial.
Portanto, para entender a paralisia facial é importante entender a anatomia e as funções do nervo facial. Leia os próximos parágrafos com atenção; tentarei explicar o nervo facial do modo mais simples possível.
Nervo facial
Nosso corpo possui 12 pares de nervos cranianos. São nervos que nascem no sistema nervoso central (cérebro) e seguem para regiões da cabeça e pescoço sem passar pela medula espinhal.
Como exemplos de nervos cranianos, podemos citar o nervo óptico, que transmite as imagens dos olhos para o cérebro, e o nervo olfatório, que faz o mesmo com os odores captados pelo nariz.
O nervo facial é um dos 12 pares de nervos cranianos. Dizemos pares, pois cada nervo craniano é composto por dois nervos originados em um dos lados do cérebro, dirigindo-se cada um para um lado do crânio.
Resumidamente, podemos dizer que o nervo facial é responsável pelos movimentos da expressão facial, sensação de gosto nos 2/3 anteriores da língua, além de participar na secreção de saliva, lágrimas e inervação do tímpano.
Como já referido, cada um dos nervos faciais nasce em um lado do cérebro; antes de chegar ao rosto, uma parte de cada nervo cruza de lado, indo inervar a face contralateral.
Esse detalhe anatômico explica por que a lesão no nervo dentro do cérebro, chamada de lesão central do nervo periférico, causa um tipo de paralisia facial, enquanto a lesão facial que ocorre depois que o nervo já ter deixado o cérebro, chamada de lesão periférica do nervo facial, causa outro tipo de paralisia facial (explicarei a diferença quando for falar do diagnóstico).
Tipos de paralisia facial
Como já dito, a paralisia facial pode ser central, como nos casos de AVC, ou periférica, como nos traumas e infecções virais.
A paralisia facial é um evento que causa grande ansiedade no paciente e em seus familiares, pois a primeira coisa que vem à cabeça é possibilidade de um derrame (AVC).
Entretanto, mais de 70% das paralisias faciais são causadas por uma doença bem mais benigna, chamada paralisia de Bell. É dela que vamos falar nas próximas linhas.
Paralisia de Bell
A paralisia facial de Bell acomete, somente nos EUA, cerca de 40.000 pacientes por ano. É uma doença bastante comum, apesar de pouco divulgada; pode acometer qualquer sexo, etnia ou idade, porém, é rara antes dos 15 anos.
A paralisia de Bell é uma paralisia facial periférica causada pelo vírus Herpes simplex, o mesmo que causa a herpes labial e genital. O vírus pode atacar o nervo facial fazendo com que o mesmo se inflame e inche, ficando comprimido dentro dos ossos do crânio, e assim, diminuindo sua capacidade de transmitir impulsos nervosos.
Eventos que interfiram com o sistema imunológico, tais como estresse, exposição ao frio, exposição solar prolongada, exercícios extenuantes, etc., podem facilitar a reativação do Herpes simplex e favorecer o surgimento da paralisia facial.
Além do vírus Herpes simples, outros vírus também podem atacar o nervo facial causando paralisia, como, por exemplo, o vírus Herpes Zoster, causador da catapora (varicela) e do herpes zoster, Epstein Barr vírus — causador da mononucleose — e citomegalovírus.
A paralisia facial causada pelo vírus herpes zoster é chamada de síndrome de Ramsay Hunt; costuma apresentar dor e vesículas na face.
Entre os principais fatores de risco para a paralisia de Bell estão a gravidez no 3º trimestre e diabetes mellitus.
Sintomas
A paralisia facial de Bell é uma paralisia facial periférica, ou seja, acomete o nervo facial depois dele já ter deixado o cérebro.
A paralisia de Bell inicia-se abruptamente, com paralisia de toda a metade da face (hemi paralisia facial) que evolui em poucas horas. Os sintomas mais característicos da paralisia de Bell são a perda da expressão em metade da face com incapacidade de fechar totalmente um dos olhos, de levantar uma das sobrancelhas, de franzir a testa e de sorrir.
As imagens abaixo ilustram os principais sinais da paralisia facial periférica.
Além dos sinais de paralisia dos músculos de uma hemiface, outros sintomas também costumam surgir, como diminuição do lacrimejamento de um dos olhos, aumento da sensibilidade ao som em um dos ouvidos, redução do paladar nos 2/3 iniciais da língua, diminuição da salivação e dor de cabeça ou dor ao redor da mandíbula.
Apesar da apreensão que um caso de paralisia facial pode gerar no paciente e nos familiares, a paralisia de Bell costuma regredir espontaneamente. Entretanto, nos casos mais agressivos, pode haver sequelas.
Os pacientes que costumam se recuperar totalmente são aqueles que apresentam sinais de regressão dos sintomas durante as primeiras 3 semanas. Quanto menor for a gravidade da paralisia, maior a chance de recuperação total. Se o paciente apresentar todos os sintomas descritos acima e não demonstrar melhora após 21 dias, existe o risco de permanecer com sequelas.
Mesmo sem tratamento, cerca de 70% dos pacientes se recuperam totalmente, porém, se a melhora costuma aparecer com 3 semanas, a recuperação completa pode demorar até 4 meses. Cerca de 7% dos casos podem recorrer em um intervalo de 10 anos; 3% dos pacientes apresentam mais de uma recorrência, com 3 a 4 episódios de paralisia facial neste mesmo espaço de tempo.
Diagnóstico
O diagnóstico da paralisia facial de Bell é normalmente clínico e de exclusão, ou seja, feito apenas após excluirmos outras causas, como, por exemplo, tumores que possam estar comprimindo o nervo facial e mimetizando uma paralisia de Bell.
A paralisia facial do AVC é diferente, pois é uma paralisia central que ocorre por isquemia do nervo dentro do cérebro. Enquanto a paralisia periférica acomete toda uma hemiface, a paralisia central poupa a região superior da testa e olhos. Além disso, o AVC costuma apresentar outros sinais associados, como paralisias no resto do corpo, desorientação, dificuldades na marcha, etc.
A paralisia facial causada por traumas é simples de ser diagnosticada, já que ela surge após a ocorrência de um trauma craniano.
Dentro do diagnóstico diferencial, ainda podemos citar as seguintes causas, muito menos comuns que paralisia de Bell, para paralisia facial:
- Doença de Lyme.
- HIV.
- Síndrome de Melkersson-Rosenthal.
- Otite média.
- Colesteatoma.
- Sarcoidose.
- Síndrome de Sjögren.
Tratamento
Agudamente, o mais importante é o cuidado com os olhos. Como o paciente com paralisia facial periférica costuma não conseguir fechar os olhos e pode apresentar redução da produção de lágrima, este pode tornar-se ressecado, com risco de cegueira por lesão da córnea.
Colírios com lágrimas artificias durante o dia e proteção dos olhos à noite, durante o sono, são importantes para proteção da visão até que os movimentos das pálpebras retornem ao normal.
Apesar da melhora espontânea na maioria dos casos, trabalhos recentes mostraram que o uso de corticoides aumenta ainda mais a chance de recuperação completa.
O regime atualmente proposto é 60 a 80 mg de prednisona oral por dia por uma semana. O tratamento deve ser iniciado nos primeiros 3 dias.
Apesar da maioria das paralisias faciais serem causadas por vírus, ainda não se conseguiu comprovar plenamente o benefício do uso de antivirais para o tratamento destes casos; entretanto, alguns grupos utilizam este tipo de droga junto com os corticoides. O antiviral mais usado é o Valaciclovir.
Referências
- Bell’s palsy: Pathogenesis, clinical features, and diagnosis in adults – UpToDate.
- Bell’s palsy: Treatment and prognosis in adults – UpToDate.
- Management of Bell palsy: clinical practice guideline – Canadian Medical Association.
- Kellerman RD, et al. Acute facial paralysis. In: Conn’s Current Therapy 2022. Elsevier; 2022.
- Ferri FF. Bell palsy. In: Ferri’s Clinical Advisor 2022. Elsevier; 2022.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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