Introdução
O câncer de mama é o tipo de câncer mais comum entre as mulheres no Brasil e no mundo. Apesar dos avanços no diagnóstico e tratamento, ele continua sendo uma das principais causas de morte feminina. No Brasil, estima-se que milhares de mulheres sejam diagnosticadas anualmente, com taxas de mortalidade variáveis dependendo do acesso ao tratamento. Nos Estados Unidos, cerca de 42.000 mulheres morrem da doença todos os anos.
O câncer de mama é raro antes dos 35 anos, mas sua incidência aumenta com a idade. Ele é a principal causa de morte por câncer entre mulheres de 45 a 55 anos. Desde a década de 1960, os casos têm aumentado, mas a taxa de mortalidade caiu cerca de 20% nos últimos anos, devido à ampliação do rastreamento e do diagnóstico precoce.
Quanto mais cedo o câncer de mama for detectado e tratado, maiores são as chances de cura completa.
Sintomas do câncer de mama
O primeiro sinal do câncer de mama costuma ser o aparecimento de um nódulo (caroço) na mama. Os nódulos malignos costumam ter as seguintes características:
- Consistência endurecida;
- Formato irregular;
- Aderência aos tecidos profundos, tornando-se menos móveis à palpação.
Por outro lado, os nódulos benignos costumam ser arredondados, mais elásticos e móveis. Embora a maioria dos caroços na mama não seja câncer, apenas uma avaliação médica pode diferenciá-los.
Além dos nódulos, outros sinais que podem indicar a presença de câncer de mama incluem:
- Alterações no mamilo, como inversão, vermelhidão, descamação ou secreção anormal (especialmente com sangue) em apenas uma das mamas.
- Assimetria mamária, com alterações no tamanho e formato de uma das mamas;
- Presença de linfonodos palpáveis na axila ou ao redor da mama;
- Mudança na textura da pele, que pode ficar espessa ou com aspecto de “casca de laranja”;
- Aparecimento de veias dilatadas ao redor da mama.
Um tipo raro de câncer de mama, a doença de Paget, pode começar como uma pequena lesão ao redor do mamilo, semelhante a uma espinha ou picada de mosquito, que não cicatriza e piora com o tempo.
Embora esses sinais possam estar relacionados a outras condições benignas, toda alteração deve ser investigada por um médico, especialmente em mulheres acima dos 35 anos.
Autoexame da mama
Quanto mais precoce for o diagnóstico, maiores são as chances de sucesso do tratamento.
O autoexame das mamas, que por muito tempo foi recomendado como estratégia de detecção precoce, não é mais indicado como método de rastreamento. Estudos demonstraram que ele não reduz a mortalidade por câncer de mama, pois geralmente detecta tumores já em estágios mais avançados.
Apesar disso, o autoexame é um procedimento simples e pode auxiliar na identificação de alterações suspeitas, especialmente em mulheres que não realizam o rastreamento adequado. Embora o câncer de mama seja raro antes dos 40 anos, o hábito de se autoexaminar pode ser iniciado a partir dos 20 anos, permitindo que a mulher conheça melhor a estrutura e as variações normais de suas mamas. Como esse órgão não é homogêneo, é comum haver diferenças naturais na textura e no formato de uma mulher para outra.
Nas primeiras tentativas, o autoexame pode parecer frustrante devido à dificuldade em reconhecer as estruturas palpáveis. No entanto, à medida que a prática se torna rotineira, a mulher se familiariza com suas mamas, o que facilita a percepção de qualquer alteração incomum ao longo do tempo.
A presença de próteses de silicone não interfere na realização do autoexame e não impede a identificação de alterações suspeitas.
O período mais indicado para realizar o autoexame é cerca de uma semana após o término da menstruação, quando as mamas estão menos inchadas e sensíveis. Para mulheres que já passaram pela menopausa, recomenda-se escolher um dia fixo do mês para manter a regularidade do exame.
Como fazer o autoexame das mamas?
O autoexame das mamas pode ser realizado em casa, de maneira simples, ajudando a mulher a conhecer melhor seu corpo e identificar possíveis alterações. A seguir, os passos para realizá-lo corretamente:
Diante do espelho:
- Fique em pé, com as mãos na cintura, e observe suas mamas. Preste atenção ao tamanho, formato, textura e cor da pele.
- Levante os braços e observe as mamas de diferentes ângulos, tanto de frente quanto de lado.
- Se tiver mamas volumosas, levante-as para examinar a região que fica sob a pele.
Durante a palpação:
- Deite-se de barriga para cima para facilitar a palpação.
- Com a ponta dos dedos, pressione suavemente a mama em pequenos movimentos circulares.
- Varie a pressão dos dedos para examinar camadas mais superficiais e profundas do tecido mamário.
- Use a mão esquerda para examinar a mama direita e a mão direita para examinar a esquerda.
- Deslize os dedos em movimentos verticais, cobrindo toda a extensão da mama, de cima para baixo e de baixo para cima, ou em padrão zigue-zague.
- O exame também pode ser realizado em pé, enquanto toma banho, pois a pele molhada facilita a palpação.

Reforçando: o autoexame das mamas não substitui a avaliação médica nem os exames de imagem, como mamografia, ultrassonografia ou ressonância magnética. Essas técnicas são essenciais para detectar alterações que ainda não são perceptíveis ao toque. Manter um acompanhamento médico regular é fundamental para a detecção precoce do câncer de mama.
Diagnóstico e rastreio
O autoexame das mamas e o exame clínico realizado pelo médico são capazes de diagnosticar menos de 10% dos casos de câncer de mama. Por essa razão, a realização de exames de rastreamento periódicos, como a mamografia, é essencial, mesmo quando o exame clínico não apresenta alterações. Esses exames são capazes de detectar lesões em estágios iniciais, aumentando as chances de um tratamento eficaz e reduzindo a mortalidade pela doença.
Os principais exames de rastreio para o câncer de mama são:
Mamografia
A mamografia é a principal ferramenta para a detecção precoce do câncer de mama. Trata-se de um exame de raio-X que pode identificar tumores em estágios iniciais, antes mesmo de serem palpáveis.
As recomendações de rastreamento variam entre instituições:
- Ministério da Saúde do Brasil (INCA, 2024): mamografia a cada 2 anos para mulheres de 50 a 69 anos.
- Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM, 2024): mamografia anual a partir dos 40 anos.
- American Cancer Society (EUA): mamografia anual dos 45 aos 54 anos, depois a cada 2 anos após os 55 anos.
- USPSTF (EUA): mamografia a cada 2 anos a partir dos 40 anos.
Mulheres com histórico familiar de câncer de mama devem iniciar o rastreamento aos 30 anos.
A mamografia digital tem uma leve vantagem sobre a mamografia convencional em mulheres com menos de 50 anos, pois oferece melhor qualidade de imagem em mamas densas. No entanto, em mulheres acima dos 50 anos, ambas as técnicas apresentam eficácia semelhante na detecção de tumores malignos.
A mamografia pode causar desconforto, especialmente se realizada nos dias que antecedem a menstruação, quando as mamas estão mais sensíveis. Para minimizar esse incômodo, recomenda-se agendar o exame para depois do fim do período menstrual.
Limitações da mamografia: a mamografia não é 100% precisa e pode não detectar até 30% dos tumores em mulheres com mamas densas. Quando um câncer de mama já provoca alterações detectáveis no exame clínico, como um nódulo palpável, a mamografia pode identificá-lo em mais de 90% dos casos, especialmente em mulheres com mamas menos densas.
Mamografia e a classificação BI-RADS
A mamografia é o exame mais utilizado para rastreamento e diagnóstico precoce do câncer de mama. Além de detectar lesões suspeitas, seu laudo segue um sistema padronizado chamado BI-RADS (Breast Imaging Reporting and Data System), desenvolvido pelo Colégio Americano de Radiologia (ACR). Esse sistema classifica os achados mamográficos em categorias numeradas de 0 a 6, ajudando médicos a interpretar os resultados e decidir a melhor conduta para cada paciente.
Classificação BI-RADS:
- BI-RADS 0 – Exame inconclusivo; exames complementares (ultrassonografia ou novas imagens) são necessários.
- BI-RADS 1 – Exame normal, sem achados suspeitos.
- BI-RADS 2 – Achados benignos, sem necessidade de acompanhamento especial.
- BI-RADS 3 – Achado provavelmente benigno; acompanhamento com nova mamografia em 6 meses.
- BI-RADS 4 – Achado suspeito; biópsia recomendada para esclarecimento.
- BI-RADS 5 – Forte suspeita de câncer de mama; biópsia altamente indicada.
- BI-RADS 6 – Câncer já confirmado por biópsia, em avaliação para tratamento.
Explicamos a classificação BI-RADS em detalhes no artigo: Classificação ACR BI-RADS (categoria 0 a 6).
Ultrassonografia das mamas
À medida que a mulher envelhece, o tecido glandular das mamas é gradualmente substituído por gordura, tornando-as menos densas. Mulheres jovens, por outro lado, possuem mamas naturalmente mais densas, o que dificulta a avaliação por mamografia, já que o tecido denso pode mascarar alterações suspeitas.
Por esse motivo, em mulheres com menos de 35 anos que identifiquem uma massa palpável suspeita, a mamografia isolada pode não ser suficiente para uma avaliação adequada. Nesses casos, recomenda-se a realização da mamografia em conjunto com a ultrassonografia das mamas, pois o ultrassom é mais eficaz na diferenciação entre cistos e nódulos sólidos em mamas densas, auxiliando no diagnóstico preciso.
Ressonância magnética das mamas
A ressonância magnética das mamas (RM mamária) é um exame de imagem de alta sensibilidade, capaz de detectar pequenas alterações nos tecidos mamários. No entanto, não é recomendada para rastreamento populacional devido ao seu alto custo, disponibilidade limitada e risco de falsos positivos.
Em vez disso, a RM mamária é indicada apenas para mulheres de alto risco para câncer de mama, como aquelas que apresentam:
- História familiar de câncer de mama em parentes de primeiro grau (mãe, irmã ou filha):
- Mulheres com um forte histórico familiar de câncer de mama têm um risco aumentado da doença.
- Quando o câncer ocorre antes dos 50 anos em parentes próximos, a vigilância deve ser intensificada.
- Mutação genética nos genes BRCA1 ou BRCA2:
- Mulheres portadoras dessas mutações têm um risco de até 72% (BRCA1) ou 69% (BRCA2) de desenvolver câncer de mama ao longo da vida.
- Para essas pacientes, a RM mamária é recomendada anualmente, muitas vezes combinada com a mamografia.
- Exposição à radioterapia torácica antes dos 30 anos:
- Mulheres que receberam tratamento com radioterapia no tórax (por exemplo, para linfoma de Hodgkin) antes dos 30 anos têm um risco aumentado de desenvolver câncer de mama.
- Nesses casos, a ressonância magnética pode ser necessária para rastreamento precoce.
Por que a ressonância magnética não é indicada para todas as mulheres?
Embora a RM mamária seja mais sensível do que a mamografia na detecção do câncer de mama, ela não é recomendada para rastreamento geral por algumas razões:
- Alto custo e disponibilidade limitada:
- A RM mamária é um exame mais caro e nem sempre está disponível em todas as unidades de saúde.
- O custo-benefício não justifica seu uso para todas as mulheres, especialmente aquelas com baixo risco de câncer de mama.
- Alta taxa de falso positivo:
- A RM mamária pode detectar alterações benignas que não são câncer, levando a exames invasivos desnecessários, como biópsias.
- Isso pode causar ansiedade e procedimentos médicos adicionais que, no final, não seriam necessários.
- Menos específica do que a mamografia
- Embora a ressonância seja mais sensível, ela pode não distinguir com precisão entre tumores benignos e malignos.
- Por isso, ela é frequentemente usada em conjunto com a mamografia, e não como um substituto.
Biopsia da mama
Quando exames de imagem, como mamografia, ultrassonografia ou ressonância magnética, detectam uma lesão suspeita, a única maneira de confirmar se há câncer de mama é por meio da biópsia. Esse procedimento consiste na remoção de uma amostra do tecido mamário para análise microscópica, permitindo a identificação de células malignas e a definição do tipo de câncer (se presente).
A biópsia é considerada o padrão ouro no diagnóstico do câncer de mama, pois fornece informações essenciais para o planejamento do tratamento. Dependendo do caso, pode ser realizada com técnicas menos invasivas, usando agulhas, ou por meio de procedimentos cirúrgicos mais complexos.
Após a retirada da amostra, o tecido mamário é analisado em laboratório para fornecer informações essenciais para o tratamento. A análise histopatológica confirma se a lesão é benigna ou maligna. Já a imuno-histoquímica avalia a expressão de receptores hormonais, como estrogênio e progesterona, e do marcador HER2, auxiliando na escolha do tratamento mais adequado. Além disso, o índice Ki-67 mede a taxa de proliferação das células tumorais, ajudando a estimar a agressividade do câncer.
Tipos de biópsia mamária
Existem diferentes métodos para realizar uma biópsia da mama, e a escolha depende de fatores como tamanho da lesão, localização, suspeita clínica e características observadas nos exames de imagem.
Punção aspirativa por agulha fina (PAAF)
A punção aspirativa por agulha fina (PAAF) é um dos métodos menos invasivos, sendo realizada com uma agulha muito fina para aspirar células do nódulo mamário. Geralmente, é guiada por ultrassonografia para garantir a precisão da coleta.
Esse procedimento é rápido, simples e pode ser feito em consultório com anestesia local ou até sem anestesia. No entanto, sua principal limitação é que apenas células isoladas são coletadas, sem preservação da estrutura do tecido, o que pode resultar em um diagnóstico inconclusivo. A PAAF é mais útil para diferenciar entre cistos benignos e nódulos sólidos.
Core biópsia (biópsia com agulha grossa)
A core biópsia (biópsia com agulha grossa) é um procedimento um pouco mais invasivo, realizado com uma agulha mais grossa para retirar fragmentos do tecido mamário.
A paciente recebe anestesia local para evitar desconforto, e a coleta pode ser guiada por ultrassonografia ou mamografia estereotáxica, que permite alcançar lesões mais profundas.
Como preserva a estrutura do tecido, a core biópsia fornece mais informações do que a PAAF, permitindo distinguir tumores invasivos de lesões benignas. Embora seja um método altamente eficaz, pode ser necessário repetir o exame se a amostra não for representativa da lesão.
Biópsia cirúrgica
A biópsia cirúrgica pode ser excisional, quando toda a lesão é removida, ou incisional, quando apenas uma parte é retirada para análise. Esse procedimento é realizado em ambiente hospitalar, com anestesia local ou geral, e pode ser guiado por marcadores metálicos em lesões não palpáveis.
Embora seja o método mais confiável quando há dúvidas no diagnóstico, é um procedimento mais invasivo, exigindo pontos e tempo de recuperação. Além disso, pode deixar cicatrizes e apresentar riscos como infecção e sangramento.
Teste genético para o câncer de mama
A predisposição genética tem um papel significativo no desenvolvimento do câncer de mama. Estima-se que até 10% dos casos de câncer de mama sejam hereditários, sendo causados por mutações genéticas herdadas. Além disso, aproximadamente 1/3 das mulheres com câncer de mama possuem histórico familiar positivo, indicando um risco aumentado para parentes de primeiro grau.
Os genes BRCA1 (Breast Cancer 1) e BRCA2 (Breast Cancer 2) são os mais estudados em relação ao câncer de mama hereditário. Eles atuam como supressores tumorais, ou seja, ajudam a reparar danos no DNA e evitam o crescimento descontrolado das células. Quando esses genes sofrem mutações, sua função protetora é perdida, levando a um maior risco de desenvolver câncer.
Mulheres que possuem mutações no BRCA1 apresentam um risco de até 72% de desenvolver câncer de mama ao longo da vida. Já as mutações no BRCA2 conferem um risco de até 69%. Além disso, mulheres com mutação em um desses genes também apresentam risco aumentado para outros tipos de câncer, como o câncer de ovário, pâncreas e melanoma.
Homens também podem herdar essas mutações e, nesses casos, o risco de câncer de mama masculino aumenta significativamente. Além disso, há um risco elevado para câncer de próstata e pâncreas.
O teste genético para BRCA1 e BRCA2 é realizado por meio de uma amostra de sangue ou saliva, que é analisada em laboratório para detectar a presença de mutações nesses genes. A análise pode ser direcionada para mutações específicas, caso haja um histórico familiar conhecido, ou abrangente, examinando diversas variantes genéticas.
Quem deve fazer o teste genético para BRCA1 e BRCA2?
O teste genético para mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 não é indicado para todas as mulheres, mas sim para aquelas que possuem um histórico sugestivo de predisposição hereditária. As principais indicações para a testagem incluem:
- Diagnóstico de câncer de mama antes dos 30 anos.
- Presença de múltiplos casos de câncer de mama e/ou ovário na família, principalmente em parentes de primeiro grau (mãe, irmãs, filhas).
- Câncer de mama bilateral (afetando ambas as mamas).
- Histórico de câncer de mama masculino na família.
- Câncer de ovário em qualquer idade, especialmente com histórico familiar da doença.
- Câncer de pâncreas associado a histórico familiar de câncer de mama e/ou ovário.
- Presença de mutações conhecidas em familiares.
- Ascendência judaica Ashkenazi, pois essa população tem uma maior frequência de mutações BRCA.
Caso a paciente se enquadre nesses critérios, o teste genético pode ser solicitado por um médico especialista, como oncologista, mastologista ou geneticista.
Para saber mais sobre os genes BRCA1 e BRCA2, leia: Câncer de mama | Genes BRCA1 e BRCA2.
Referências
- Genetic/Familial High-Risk Assessment: Breast, Ovarian, Pancreatic, and Prostate Guidelines – National Comprehensive Cancer Network (NCCN).
- Clinical features, diagnosis, and staging of newly diagnosed breast cancer – UpToDate.
- Diagnostic evaluation of suspected breast cancer – UpToDate.
- Breast Cancer Screening – National Cancer Institute.
- Screening for Breast Cancer – CDC.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.