Brucelose: causas, sintomas e tratamento

Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

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brucelose

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O que é brucelose?

A brucelose é uma infecção provocada por bactérias do gênero Brucella, que é transmitida de animais infectados para o ser humano.

A forma mais comum de infecção se dá através da ingestão de laticínios crus ou não pasteurizados. As bactérias também podem ser transmitidas pelo ar ou pelo contato direto com animais infectados, tais como gado, ovelhas, cabras, porcos ou cães.

Várias espécies da bactéria Brucella podem causar doença nos seres humanos, mas quatro delas são responsáveis por quase todos os casos descritos:

  • Brucella melitensis (isolada em ovelhas, cabras e camelos).
  • Brucella abortus (isolada em bovinos).
  • Brucella suis (isolada em suínos) .
  • Brucella canis (isoladoa em cães).

No mundo, a maioria dos casos humanos é causada pela B. melitensis, mas, no Brasil, a espécie mais isolada é o B. abortus.

A infecção humana causada pelas B. melitensis e B. suis costuma ser mais mais agressiva que as infecções provocadas pelas espécies B. abortus ou B. canis.

Os locais com maior frequência de brucelose são aqueles onde é comum o consumo de leite de vaca e queijos de cabra não pasteurizados. São eles:

  • Sul da Europa: Portugal, Espanha, Turquia, Itália, Grécia e França.
  • Europa Oriental.
  • México.
  • América do Sul e Central.
  • África.
  • Oriente Médio.

Em todo mundo são diagnosticados anualmente cerca de 500 mil novos casos de brucelose.

Transmissão

Transmissão de animais para o homem

A brucelose é um zoonose, ou seja, uma infecção transmitida de animais para humanos.

As principais vias de transmissão da bactéria Brucella são:

  • Consumo de derivados de leite infectados que não passaram pelo processo de pasteurização (leite, queijos, manteiga ou sorvetes).
  • Consumo de carne mal passada.
  • Contato direto da pele ou das mucosas com tecido de animal infectado (como placenta ou produtos de aborto) ou fluidos de animais infectados (como sangue, urina, sêmen ou leite).
  • Transmissão pelo ar através da inalação de partículas das vias aéreas do animal infectado (saliva, secreções respiratórias ou secreção ocular).

A doença atinge preferencialmente pessoas que têm contato próximo com animais rurais ou que trabalham na cadeia de produção de laticínios, carnes e seus derivados.

As profissões de maior risco para contaminação pela Brucella são:

  • Vaqueiros.
  • Pastores.
  • Tratadores de animais.
  • Caçadores.
  • Produtores de carne, leite e queijo.
  • Veterinários.
  • Trabalhadores de frigorifico.
  • Trabalhadores de laboratórios de microbiologia que lidam com culturas de Brucella ou desenvolvem vacinas.

Os animais mais relacionados à transmissão da brucelose são:

  • Gado.
  • Cabra.
  • Ovelha.
  • Porco.
  • Cães, especialmente aqueles usados na caça.
  • Veado.
  • Alce.
  • Bisão.
  • Rena.
  • Camelo.

Transmissão entre humanos

Foram descritos raros casos de transmissão direta de humano para humano devido à transfusão de sangue, transplante de tecidos, contato sexual, amamentação, transmissão de mãe para filho durante o parto ou infecção hospitalar.

Não há evidências de que a Brucella possa ser transmitida entre as pessoas por contatos normais no dia a dia, como aperto de mão, abraços ou até mesmo beijo.

Sintomas

O período médio de incubação da brucelose é de 2 a 4 semanas, mas há casos descritos de vários meses de intervalo entre a contaminação e o aparecimentos dos primeiros sintomas.

Os sintomas da brucelose geralmente se iniciam com um quadro insidioso de febre, mal-estar, dores articulares e suores noturnos (associados a um odor forte e peculiar de mofo).

Ao exame físico é comum encontrarmos o fígado e/ou o baço de tamanho aumentado.

Sinais e sintomasFrequência
Febre76%
Fraqueza68%
Suores noturnos72%
Dor nas articulações80%
Aumento do fígado50%
Aumento do baço29%

O padrão de febre é variável; ela pode ser de curta duração, com picos de alta temperatura e calafrios, ou pode ser baixa, persistente e prolongada.

Sintomas adicionais podem incluir perda de peso, lombalgia, dor de cabeça, tontura, anorexia, dor abdominal e tosse.

Nas análises laboratoriais, o paciente costuma apresentar elevação das enzimas do fígado (TGO e TGP), anemia e aumento dos linfócitos.

Complicações

Algumas pessoas se recuperam espontaneamente, enquanto outras desenvolvem sintomas persistentes, como, por exemplo, febre e fraqueza que vão e voltam ao longo das semanas.

As complicações surgem quando a infecção atinge órgãos internos, tais como rins, cérebro, ossos e pulmões.

As principais complicações da brucelose serão resumidas a seguir.

Doença osteoarticular

A doença osteoarticular é a complicação mais comum de brucelose, ocorrendo em até 70% dos pacientes infectados. Artrite periférica, sacroiliíte e espondilite são as formas mais comuns.

A sacroiliíte, inflamação da articulação do sacroilíaco (junção articular entre o osso sacro da coluna vertebral e osso ilíaco), ocorre em até 80% daqueles com doença osteoarticular.

Os casos de artrite periférica geralmente envolvem os joelhos, quadris e tornozelos, que ficam inchados, quentes e muito dolorosos.

A espondilite, inflamação das articulações da coluna vertebral, é uma complicação grave da brucelose. Ela é mais comum em pacientes idosos.

Trato geniturinário

O envolvimento geniturinário é a segunda forma mais comum de brucelose focal. Ocorre em até 8% dos casos.

Nos homens, a orquite ou epididimite são as manifestações mais comuns; prostatite e abscesso no testículo ocorrem com menos frequência.

Nas mulheres, o abscesso tubo-ovariano, cistite, nefrite intersticial, glomerulonefrite e abscesso renal são as formas mais descritas.

Sistema nervoso

O envolvimento neurológico ocorre em até 5% dos casos.

As manifestações incluem meningite (aguda ou crônica), encefalite, abscesso cerebral, mielite, radiculite e / ou neurite (com envolvimento de nervos cranianos ou periféricos).

Sistema cardiovascular

O envolvimento cardiovascular ocorre em até 3% dos casos.

As manifestações possíveis incluem: endocardite, miocardite, pericardite e aneurisma micótico da aorta ou ventrículos.

A endocardite é a complicação cardiovascular mais comum (1 a 2% dos casos) e é a principal causa de morte atribuível à brucelose.

Pulmões

O envolvimento pulmonar ocorre em até 2% dos casos.

Bronquite, pneumonite intersticial, pneumonia, nódulos pulmonares, derrame pleural, linfadenopatia hilar, empiema ou abscessos são as complicações pulmonares mais comuns.

Alterações dermatológicas

Manifestações na pele ocorrem em até 10% dos casos. Os achados podem incluir erupções de pele, nódulos, eritema nodoso, ulcerações, petéquias, púrpura, vasculite granulomatosa e abscessos.

Gravidez

A brucelose em mulheres grávidas está associada ao risco de aborto espontâneo, morte fetal intra-uterina, parto prematuro e infecção intra-uterina.

Diagnóstico

A brucelose deve ser sempre suspeitada nos pacientes com sintomas típicos (febre noturna, fraqueza e dor articular) e história epidemiológica compatível com contato com animais ou consumo de laticínios não tratados.

Para confirmação do diagnóstico, testes laboratoriais são necessários. Os mais comuns são:

  • Cultura da bactéria a partir de sangue, urina, líquido cefalorraquidiano, líquido sinovial, líquido pleural ou tecidos (como medula óssea ou biópsia hepática).
  • Sorologia pareada (pesquisa de anticorpos contra Brucella).
  • PCR (pesquisa do DNA da bactéria no sangue.).

A pesquisa da bactéria na medula óssea costuma ser o método mais confiável. Na prática, porém, a sorologia é a forma mais utilizada, por ser de mais fácil execução.

Tratamento

O tratamento da brucelose é feito com antibióticos. O tempo de tratamento preconizado é de 6 semanas.

Em geral, o paciente se recupera por completo, mas se o tratamento não for iniciado precocemente, o paciente pode ficar com sequelas das complicações.

A taxa de recidiva após o tratamento é de até 15%. O ressurgimento dos sintomas costuma ocorrer nos primeiros seis meses após a conclusão do tratamento, mas pode demorar até 12 meses para voltar.

As causas de recidiva incluem um regime antibiótico inadequado, seja por prescrição de antibióticos errados, duração inadequada do tratamento ou abandono do paciente antes do fim do prazo.

As recidivas devem ser tratadas com repetição do esquema antibiótico (esquemas corretos estão listados abaixo).

Com tratamento adequado, a taxa de mortalidade da brucelose é de menos de 1%.

Adultos

Os esquemas terapêuticos mais indicados para brucelose são:

  • Doxiciclina por via oral 100 mg 12/12 horas + Rifampicina por via oral 600 a 900 mg por dia por 6 semanas.
  • Doxiciclina por via oral 100 mg 12/12 horas por 6 semanas + Estreptomicina 1000 mg por dia intramuscular ou intravenoso nos primeiros 14 a 21 dias.
  • Doxiciclina por via oral 100 mg 12/12 horas por 6 semanas + Gentamicina 5 mg/kg/dia intramuscular ou intravenoso nos primeiros 7 a 10 dias.

Crianças maiores de 8 anos

Nas crianças acima de 8 anos, o regime antibiótico é o mesmo, mas as doses devem ser ajustadas de acordo com o peso (a dose por mg/kg nunca deve ultrapassar a dose do adulto).

  • Doxiciclina por via oral 4.4 mg/kg/dia divididos em 12/12 horas + Rifampicina por via oral 15 a 20 mg/kg/dia por 6 semanas.
  • Doxiciclina por via oral 4.4 mg/kg/dia divididos em 12/12 horas por 6 semanas + Estreptomicina 15 a 40 mg/kg/dia intramuscular ou intravenoso nos primeiros 14 a 21 dias.
  • Doxiciclina por via oral 4.4 mg/kg/dia divididos em 12/12 horas por 6 semanas + Gentamicina 5 mg/kg/dia intramuscular ou intravenoso nos primeiros 7 a 10 dias.

Crianças menores de 8 anos

Nas crianças com menos de 8 anos, o tratamento indicado é Sulfametoxazol-trimetoprim (Bactrim) 50 mg/kg/dia + 10 mg/kg/dia de 12/12 horas + Rifampicina 15 a 20 mg/kg/dia por dia por 6 semanas.

Gestantes

Nas grávidas o tratamento indicado é Sulfametoxazol-trimetoprim 800 mg + 160 mg por dia + Rifampicina por via oral 600 a 900 mg por dia por 6 semanas.

Prevenção

A brucelose é uma infecção prevenível. Para reduzir o risco de contaminação você deve:

  • Evitar o consumo de carne crua
  • Evitar o consumo de leite, queijo ou sorvete não pasteurizados.
  • Ferver por 10 minutos qualquer leite não pasteurizado que venha a ser consumido.
  • Usar luvas e óculos de proteção ao manusear animais ou tecidos de animais.
  • Cobrir qualquer ferida aberta na pele ao entrar em contato com sangue animal.
  • Usar roupas e luvas de proteção ao ajudar os animais a dar à luz.

Existe vacina veterinária contra a brucelose para animais. Se você trabalha com animais domésticos, considere vaciná-los para brucelose.

Infelizmente, ainda não existe vacina para brucelose em humanos.


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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