Introdução
As artérias coronarianas são as artérias que nutrem o músculo cardíaco. A obstrução de uma ou mais dessas artérias por placas de colesterol é a principal causa de angina e infarto agudo do miocárdio.
O cateterismo cardíaco é um procedimento médico utilizado para diagnosticar e tratar, caso necessário, as obstruções das artérias coronarianas.
O que é a doença isquêmica cardíaca?
A doença isquêmica cardíaca é causada por obstrução de uma ou mais artérias coronárias, impedindo o fluxo adequado de sangue para o músculo cardíaco, chamado de miocárdio.
Como qualquer tecido do nosso corpo, o miocárdio quando privado de seu suprimento de sangue entra em isquemia e pode sofrer necrose, caracterizando o infarto do miocárdio.
Como o mecanismo básico desta doença é a obstrução de uma artéria coronária, o tratamento consiste em desobstruí-la o mais rápido possível, impedindo que uma isquemia se torne um infarto.
No texto Infarto do miocário – Causas e Prevenção explicamos com detalhes todo esse processo.
Existem três tipos de tratamento para os pacientes com angina causada pela obstrução das artérias coronarianas:
- Tratamento clínico com medicamentos que melhoram a circulação de sangue nas coronárias.
- Cirurgia de bypass cardíaco (também conhecida como ponte de safena)
- Angioplastia coronária.
As duas primeiras opções de tratamento serão explicadas em textos à parte. Por ora, focaremos no cateterismo cardíaco e na angioplastia.
O que é cateterismo cardíaco? O que é coronariografia?
Começaremos pelo cateterismo cardíaco, também conhecido como cineangiocoronariografia ou angiografia coronariana.
O cateterismo cardíaco é uma angiografia, um exame radiológico no qual podemos analisar os vasos sanguíneos. A teoria do exame é simples:
- Escolhemos um vaso a ser estudado, por exemplo, as artérias coronárias.
- Através de uma punção da artéria femoral (que fica na coxa), ou na artéria radial (no braço), introduzimos um longo cateter pela artéria aorta até chegar ao coração, no ponto onde nascem as artérias coronárias.
- Através deste cateter administra-se seguidamente pequenos volumes de contraste venoso radiopaco fazendo com que o mesmo, ao passar pelas coronárias, “pinte-as” de modo a torná-las visíveis através de um exame radiológico.
Ao invés de uma radiografia simples, na coronariografia obtemos várias imagens seguidas, fazendo um filme de toda a passagem do contraste pelas artérias, daí o nome cineangiocoronariografia.
Veja o vídeo abaixo para facilitar a compreensão. Nesse filme é possível ver o contraste sendo administrado pelo cateter diretamente nas artérias coronárias. São 4 administrações seguidas apresentadas no vídeo.
Se uma das artérias estiver com seu interior preenchido por placas de colesterol que obstruam a passagem de sangue, elas também estarão obstruindo a passagem do contraste, sendo isso facilmente perceptível durante a angiografia.
A coronariografia é atualmente o melhor método para o diagnóstico das obstruções das artérias coronárias.
Uma vez realizada a coronariografia, podemos decidir que estratégia adotaremos com o paciente.
Se os vasos estiverem sem sinais de obstrução, o exame termina e o cateter é retirado. Por outro lado, se a angiografia apontar lesões obstrutivas das coronárias, torna-se necessário desobstruí-las.
Se as lesões forem muito graves e múltiplas, a alternativa é a cirurgia de bypass. Se apenas um, ou no máximo dois ramos das coronárias estiverem doentes, é possível realizar a angioplastia das mesmas.
O que é angioplastia?
A angioplastia é um procedimento não cirúrgico no qual é possível desobstruir artérias com deficiente fluxo de sangue causado por placas de colesterol em sua parede. A angioplastia pode ser feita em várias artérias do corpo, mas nesse texto falaremos apenas da angioplastia coronariana.
A angioplastia é realizada imediatamente após a coronariografia. Uma vez identificada a artéria obstruída, um balão especial para angioplastia é inserido desinflado pelo cateter que agora está localizado dentro da artéria coronária doente. Ao chegar no local da placa, este balão é inflado até uma pressão de 20 atmosferas, tornando-o inacreditavelmente duro, capaz de esmagar literalmente a placa de gordura, abrindo novamente a luz da artéria e permitindo que o fluxo de sangue retorne ao normal.
Reparem na imagem abaixo mostrando uma coronariografia feita antes da angioplastia por balão e outra feita depois da angioplastia. Note que antes havia uma falha no enchimento da artéria pelo contraste, indicando uma obstrução do fluxo sanguíneo. Após a destruição da placa pelo balão, o contraste passou a seguir o seu caminho sem restrições.
O termo cateterismo cardíaco engloba dois procedimentos diferentes: o cateterismo para diagnóstico, que é a simples coronariografia, e o cateterismo terapêutico, que inclui a angioplastia. Quando o paciente apenas diz que fez um cateterismo cardíaco, é preciso completar a informação dizendo se foi feito angioplastia ou não, para podermos saber exatamente que tipo de procedimento ele foi submetido.
A angioplastia por balão apresenta ótimos resultados a curto prazo, com taxas de sucesso acima de 90% na resolução da dor e no restabelecimento do fluxo sanguíneo. Porém, a médio/longo prazo a reobstrução da artéria coronária é muito comum. Cerca de 30% dos pacientes terão suas artérias novamente obstruídas em um período de 6 meses. Por isso, além da angioplastia com balão, um procedimento adicional é necessário para se assegurar uma patência prolongada das coronárias: a implantação de um stent.
O que é angioplastia com stent?
O stent é uma prótese metálica expansível, em forma cilíndrica, que é implantada logo após a angioplastia pelo balão com o intuito de diminuir a chance da artéria coronária ficar novamente obstruída por aterosclerose com o passar do tempo.
O processo de implantação do stent é igual ao da angioplastia. Veja a ilustração abaixo.
Atualmente praticamente não se faz mais angioplastia sem a colocação de stent devido à grande diferença de resultados entre os dois procedimentos.
Após a angioplastia com stent
A angioplastia com stent é um procedimento razoavelmente simples e o paciente costuma ter alta no dia seguinte, ficando internado durante a noite apenas para observação.
Ao final do procedimento, o cateter é removido e o paciente deve ficar deitado por algumas horas com compressão sobre a artéria femoral para evitar a formação de hematomas no local da inserção do cateter.
O paciente com stent normalmente precisa tomar medicamentos que inibam a ação das plaquetas para inibir a formação de coágulos e a trombose do stent. Aspirina e clopidogrel (Plavix®) são as duas drogas mais prescritas.
Quando aplicável, o controle do diabetes, da hipertensão, do colesterol, a perda de peso e parar de fumar são fatores essenciais para impedir a trombose do stent.
Os stents mais modernos são compostos por materiais que não contraindicam a realização de ressonância magnética nuclear (RMN), ao contrário das próteses mais antigas. Se você tem um stent e precisa fazer uma RMN, pergunte ao seu cardiologista se o seu stent é seguro, denominado pelo fabricante como “MR safe”.
Complicações
Não existe procedimento médico invasivo sem riscos. As complicações do cateterismo cardíaco são incomuns se tomadas todas as devidas precauções, mas sempre existe um pequeno risco de surgirem problemas. Entre as possíveis complicações, podemos citar:
- Alergia ao contrate venoso.
- Hematomas e sangramentos no local da punção.
- Embolização de fragmentos do trombo após a angioplastia.
- AVC.
- Infarto agudo do miocárdio.
- Rotura da artéria coronária.
- Arritmia cardíaca.
- Insuficiência renal aguda.
Sobre esta última complicação, achamos importante gastar algumas linhas.
Insuficiência renal aguda após cateterismo cardíaco
A maioria dos contrastes venosos usados para exames radiológicos são tóxicos para os rins, causando uma temporária queda na taxa de filtração do sangue.
Pessoas com rins sadios não apresentam complicações, pois, mesmo que percam metade da função renal por alguns dias, conseguem sobreviver bem com 50% restantes de função. Pessoas que já tem doença renal, entretanto, não têm essa reserva para tolerar grandes quedas na sua função renal, sendo comum a ocorrência de insuficiência renal aguda transitória, com duração média de 7 dias.
O cateterismo cardíaco em paciente com diagnóstico prévio de insuficiência renal crônica deve ser feito com muito cuidado, e se possível com o auxílio de um médico nefrologista, pois o risco de deterioração da função renal nas primeiras 48 horas após o contraste é imenso. A toxicidade renal pode ser tão grave que alguns pacientes chegam a precisar de hemodiálise durante alguns dias.
Os maiores risco para nefrotoxicidade do contraste ocorrem nos pacientes que têm:
- Valor de Creatinina sanguínea antes do exame maior que 1,5 mg/dl.
- Nefropatia por diabetes mellitus.
- Mieloma múltiplo.
- Insuficiência cardíaca.
Referências
- Percutaneous coronary intervention with intracoronary stents: Overview – UpToDate.
- Complications of diagnostic cardiac catheterization – UpToDate.
- Cardiac Catheterization – American Heart Association.
- What Is a Stent? – American Heart Association.
- Cardiac Catheterization – National Heart, Lung, and Blood Institute.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.
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