TSH e T4 Livre (resultados dos exames da tireoide)

Apesar do hipotireoidismo e do hipertireoidismo serem doenças diferentes, com sintomas diferentes, o diagnóstico é feito da mesma maneira: através da dosagem dos hormônios tireoidianos no sangue, nomeadamente TSH e T4 livre.
Dr. Pedro Pinheiro
Dr. Pedro Pinheiro

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TSH e T4 livre

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O que são hipotireoidismo e hipertireoidismo?

Hipotireoidismo é a doença provocada pela produção insuficiente de hormônios da tireoide. Já o hipertireoidismo é o oposto, é um quadro provocado pelo excesso de produção de hormônios tireoidianos.

Apesar de serem doenças diferentes, com sintomas diferentes, o diagnóstico é feito da mesma maneira: através da dosagem dos hormônios tireoidianos no sangue, nomeadamente TSH e T4 livre.

Nesse texto explicaremos o que são os hormônios da tireoide e como interpretar os seus resultados nos exames de sangue.

Como funciona a tireoide?

A tireoide é uma glândula em forma de borboleta, que se localiza na base do pescoço. A tireoide capta o iodo consumido nos alimentos e o junta a um aminoácido chamado tirosina para criar dois hormônios, conhecidos como triiodotironina (T3) e tiroxina (T4).

O T3 e o T4 sintetizados pela tireoide são lançados na corrente sanguínea, onde vão atuar em todas as células do nosso organismo, regulando o metabolismo das mesmas, ou seja, ditando o modo como as células vão transformar oxigênio, glicose e calorias em energia.

  • Quando a tireoide produz muito T3 e T4, nosso metabolismo acelera.
  • Quando a tireoide produz pouco T3 e T4, o nosso metabolismo se torna mais lento.

Em geral, do total de hormônios produzidos pela tireoide, 80% são T4 e 20% são T3. Apesar de ser produzido em menor quantidade, o T3 é um hormônio muito mais potente que o T4, sendo a sua concentração sanguínea a responsável direta por ditar o ritmo do metabolismo do corpo.

O T4 é, na verdade, um pró-hormônio, ou seja, um precursor do T3. 80% do T4 lançado na corrente sanguínea, ao chegar em órgãos ou tecidos, como fígado, rins, baço, músculos ou gordura, é transformado em T3 para utilização das células.

Portanto, o T3 é efetivamente o hormônio tireoidiano que age no nosso organismo, tendo sua origem predominantemente no T4 circulante. Apenas uma pequena parcela do T3 atuante é diretamente produzida pela tireoide.

O que é o T4 livre?

Mais de 99% do T4 e do T3 circulantes na corrente sanguínea estão ligados a uma proteína chamada TBG (globulina ligadora de tiroxina, sigla em inglês).

Esses hormônios ligados à TBG são inócuos, não podendo ser utilizados pelos órgãos e tecidos. Portanto, apenas uma ínfima fração, chamada T4 livre e T3 livre são quimicamente ativas e podem modular o metabolismo do corpo. Apenas o T4 livre pode ser transformado em T3 nos órgãos e tecidos.

Resumindo:

  • Quem efetivamente age nas células do corpo modulando o metabolismo é o hormônio T3.
  • Grande parte do T3 ativo é derivado da conversão de T4 nos tecidos periféricos.
  • Como mais de 99% do T4 está ligado à TBG, no final das contas, apenas uma ínfima parcela de menos de 1% de T4 livre é efetivamente quem fornece T3 para os órgãos e tecidos do corpo usarem em suas células.

Concluindo, a dosagem do T4 livre sanguíneo é o exame que nos dá realmente a noção de quanto hormônio tireoidiano potencialmente útil há na circulação. Se houver muito T4 livre circulante, haverá muita produção de T3 nos órgãos, levando ao hipertireoidismo. Se houver pouco T4 livre circulante, haverá falta de T3 para os tecidos, provocando o hipotireoidismo.

Na prática clínica, a dosagem de T4 livre acaba sendo, na maioria dos casos, mais útil que a dosagem de T3 ou T3 livre.

Qual é o papel do TSH?

A quantidade de T3 e T4 produzidas pela glândula tireoide é cuidadosamente controlada pelo sistema nervoso central, mais especificamente pela hipófise (também chamada de glândula pituitária), uma glândula localizada na base do cérebro.

Em pessoas com a tireoide sadia, a quantidade de hormônios tireoidianos livres no sangue é mantida sempre de forma a não haver nem excessos, nem insuficiência. Se há T4 livre a mais no sangue, a tireoide reduz a sua produção de T3 e T4. Por outro lado, se há sinais de que os níveis de T4 livre começam a ser insuficientes, a tireoide rapidamente começa a produzir mais T3 e T4, para não deixar o metabolismo corporal desacelerar.

A ordem para a tireoide aumentar ou reduzir a sua produção de T3 e T4 vem da hipófise, por meio de um hormônio chamado TSH (hormônio estimulador da tireoide, sigla em inglês).

Funcionamento da tireoide
Funcionamento da tireoide

Veja a figura acima e acompanhe o raciocínio. Quando existe pouco hormônio tireoidiano circulante, a hipófise sente essa deficiência e aumenta a secreção de TSH, dando ordem para haver uma maior produção de T3 e T4 pela tireoide.

Quando os níveis de T3 e T4 voltam a ficar satisfatórios, a hipófise sente esta normalização e reduz automaticamente a produção de TSH, reduzindo, consequentemente, o estímulo sobre a tireoide, evitando que esta passe a produzir hormônios em excesso.

O balanço entre os níveis de TSH e T4 livre é muito delicado. A hipófise precisa manter sempre uma concentração de TSH ideal, de modo que, ao mesmo tempo, impeça a tireoide de produzir poucos hormônios, mas também não a estimule a produzi-los demais.

Quais são os valores normais de TSH e T4 livre?

Na imensa maioria dos casos, bastam as dosagens de TSH e T4 livre para podermos avaliar como anda o funcionamento da tireoide.

Antes de explicarmos como interpretar os resultados destes dois hormônios, é preciso saber quais são os seus valores de referência (estes valores podem mudar discretamente de um laboratório para outro).

  • Valores normais de TSH: 0,4 a 4,5 mU/L (alguns centros consideram normal até 5,0 mU/L )
  • Valores normais de T4 livre: 0,7 a 1,8 ng/dl.

A atual técnica de detecção do TSH é chamada TSH ultra sensível, pois ao contrário das primeiras gerações do exame, o método ultra sensível consegue detectar níveis tão baixos de TSH quanto 0,01 mU/L.

Nota: um estudo realizado pela National Academy of Clinical Biochemistry dos Estados Unidos propôs que o limite superior para os níveis normais de TSH em uma tireoide saudável deveria ser de até 2,5 mU/L. Esta recomendação baseia-se na constatação de que 95% dos indivíduos saudáveis avaliados apresentavam níveis de TSH situados entre 0,4 e 2,5 mU/L. Em contrapartida, uma outra pesquisa realizada na Alemanha identificou uma faixa normal ligeiramente mais extensa, variando de 0,3 a 3,63 mU/L. A adoção do limite de 2,5 mU/L como o máximo normal para o TSH poderia levar a um aumento no diagnóstico de hipotireoidismo subclínico, uma forma leve de disfunção tireoidiana. No entanto, ainda não há evidências concretas de que níveis de TSH entre 2,5 e 5,0 mU/L sejam efetivamente nocivos. Isso levanta um questionamento sobre a pertinência de classificar indivíduos com esses índices dentro do espectro de problemas tireoidianos.

O que significa ter TSH elevado?

Os níveis de TSH se elevam sempre que a glândula hipófise sente haver uma queda nos níveis de hormônio tireoidiano na circulação.

Nos pacientes com hipotireoidismo, a hipófise precisa manter níveis de TSH mais elevados que o normal (acima de 4,5 ou 5 mU/L), de forma estimular constantemente a tireoide a aumentar a sua produção de T3 e T4.

A partir deste ponto, podemos ter três situações distintas quando o TSH está elevado:

Hipotireoidismo subclínico

Se a doença da tireoide ainda for branda e a elevação do TSH conseguir estimular a produção dos hormônios tireoidianos para mantê-los em níveis adequados, o paciente não apresentará sintoma algum, já que os sintomas do hipotireoidismo só surgem quando os níveis de T4 livres estão baixos. Este é o caso do hipotireoidismo subclínico, que é uma forma inicial de hipotireoidismo.

Os pacientes com hipotireoidismo subclínico costumam ter TSH um pouco elevado, entre 5,0 e 10,0 mU/L, e um T4 livre normal, entre 0,7–1,8 ng/dl.

Hipotireoidismo clínico

Se a doença da tireoide for mais severa, por mais que a hipófise aumente a produção de TSH, a tireoide do paciente será incapaz de responder produzindo mais hormônios tireoidianos para normalizar os níveis sanguíneos.

Nesses casos, o paciente tem TSH elevado, geralmente acima de 10 mU/L e níveis baixos de T4 livre. Como o seu T4 livre está baixo, o paciente costuma ter os sintomas típicos do hipotireoidismo.

Pacientes com hipotireoidismo não tratado podem ter níveis muito elevados de TSH, às vezes, acima de 100 mU/L.

Hipertireoidismo central

Uma situação completamente diferente ocorre quando o paciente tem níveis elevados de TSH, mas também de T4 livre.

Nesse caso, o problema não está na tireoide, que responde adequadamente ao estímulo do TSH. O problema está na hipófise, que mantém uma produção elevada de TSH apesar de o paciente já ter níveis elevados de hormônio tireoidianos na circulação. Como há excesso de T4 livre, o paciente apresenta sintomas de hipertireoidismo.

Essa forma de hipertireoidismo, causada por disfunção da hipófise, é mais rara que o hipertireoidismo provocado por doença da tireoide.

Em resumo, o que pode indicar um nível alto de TSH?

  • Hipotireoidismo subclínico: distúrbio leve da tireoide com TSH ligeiramente elevado (5,0-10,0 mU/L), mas hormônios tireoidianos (T4 livre) normais, sem apresentar sintomas.
  • Hipotireoidismo clínico: doença avançada da tireoide com TSH muito alto (geralmente acima de 10 mU/L) e níveis baixos de T4 livre, levando a sintomas típicos de hipotireoidismo.
  • Hipertireoidismo central: condição incomum em que tanto o TSH quanto o T4 estão elevados, causada por disfunção hipofisária, resultando em sintomas de hipertireoidismo.

O que significa ter TSH baixo?

O raciocínio feito para o TSH baixo é o mesmo para o TSH elevado. Se há muita circulação de hormônio tireoidiano no sangue, a hipófise reduz a sua liberação de TSH, diminuindo o estímulo sobre a tireoide.

Do mesmo modo, podemos ter 3 situações distintas quando o TSH está baixo:

Hipertireoidismo subclínico

Se a tireoide anda muito funcionante, os níveis de TSH desabam para cessar o estímulo sobre a mesma. No hipertireoidismo subclínico, o TSH costuma estar abaixo de 0,4 mU/L, mas os níveis de T4 livre encontram-se normais. O paciente, portanto, não apresenta sintomas.

Hipertireoidismo clínico

Algumas doenças fazem com que a tireoide fique excessivamente ativa e passe a funcionar independentemente da hipófise, produzindo hormônios mesmo que não haja estímulo pelo TSH.

Quando há muito T4 livre na corrente sanguínea, a hipófise encontra-se “inibida”, praticamente sem produzir TSH, com níveis de sanguíneos abaixo de 0,1 mU/L. Estes são os casos de hipertireoidismo clínico.

Hipotireoidismo central

Se o TSH estiver muito baixo, mas o T4 livre também, estamos diante de uma tireoide sadia, que responde adequadamente à falta de TSH.

O problema mais uma vez será da hipófise, que diante de um nível baixo de T4 livre mostra-se incapaz de aumentar a liberação de TSH, de forma a estimular a tireoide a produzir mais hormônios e impedir que o paciente tenha hipotireoidismo.

Essa forma de hipotireoidismo, originada na hipófise, é mais rara que o hipotireoidismo originado por problemas na tireoide.

Em resumo, o que pode indicar um nível baixo de TSH?

  • Hipertireoidismo subclínico: tireoide hiperativa, levando os níveis de TSH a cair abaixo de 0,4 mU/L para minimizar a estimulação da glândula, enquanto os níveis de T4 livre permanecem normais. Os pacientes geralmente não apresentam sintomas.
  • Hipertireoidismo clínico: a glândula tireoide torna-se excessivamente ativa e funciona independentemente da glândula pituitária. Isso resulta em uma alta concentração de T4 livre e níveis extremamente baixos de TSH (abaixo de 0,1 mU/L), levando a sintomas óbvios de hipertireoidismo devido ao T4 livre elevado.
  • Hipotireoidismo central: os níveis de TSH e T4 livre são baixos, indicando uma tireoide com funcionamento normal que está respondendo adequadamente à redução do TSH. O problema subjacente está na glândula pituitária, que não consegue aumentar a produção de TSH em resposta ao baixo nível de T4.

A dosagem de anticorpos contra a tireoide, como o Anti-TPO, anti-tireoglobulina e TRAb são abordados em um artigo à parte, que pode ser acessado neste link: Anticorpos contra a tireoide: anti-TPO, TRAb e anti-tireoglobulina


Referências


Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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