Síncope (desmaio e reflexo vagal)

A síncope, ou desmaio, é a perda temporária da consciência causada por redução do fluxo sanguíneo cerebral. Pode ter causas benignas, como síncope vasovagal, ou indicar problemas cardíacos e neurológicos. Episódios recorrentes devem ser investigados.
Dr. Pedro Pinheiro
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Síncope

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O que é o desmaio?

O desmaio, conhecido cientificamente como síncope, é um evento caracterizado pela perda súbita e temporária da consciência, acompanhada pela incapacidade de manter a postura, seguido de uma recuperação rápida e completa.

A síncope ocorre quando há uma redução momentânea do fluxo sanguíneo para o cérebro, levando à interrupção temporária da atividade cerebral. Embora seja um sintoma relativamente comum, suas causas variam desde condições benignas, como reflexos vagais exagerados, até doenças graves, como arritmias cardíacas e distúrbios neurológicos.

A principal causa do desmaio é a chamada síncope vasovagal, uma resposta exagerada do sistema nervoso autônomo que leva à queda da pressão arterial e desaceleração dos batimentos cardíacos. Entretanto, outros fatores podem estar envolvidos, como problemas cardíacos, alterações neurológicas, hipotensão postural, hipoglicemia, anemia, desidratação e efeitos adversos de medicamentos.

É importante diferenciar a síncope de outras condições médicas que podem causar perda da consciência ou queda súbita, como acidente vascular cerebral (AVC), crises epilépticas e paradas cardíacas. Embora a síncope geralmente seja benigna, casos recorrentes ou associados a sintomas preocupantes podem indicar a presença de uma doença subjacente que requer avaliação médica detalhada.

Se a pessoa sente tontura, escurecimento da visão ou sensação de que vai cair, mas não perde completamente a consciência, esse fenômeno é chamado de pré-síncope.

Nos próximos tópicos, exploraremos as principais causas do desmaio, como diferenciá-lo de outras condições médicas e quais sinais indicam a necessidade de uma avaliação médica urgente.

Situações que podem ser confundidas com síncope (desmaio)

Antes de falarmos especificamente sobre as causas do desmaio, é essencial diferenciar a síncope de outras condições médicas que podem causar queda ou perda da consciência, mas que não são desmaios. Algumas dessas condições são muito mais graves e exigem atendimento médico imediato.

1. Acidente vascular cerebral (AVC)

O AVC, também conhecido como derrame cerebral, ocorre quando há uma interrupção do fluxo sanguíneo para uma parte do cérebro, resultando em danos neurológicos.

Diferente da síncope, o AVC geralmente não causa perda de consciência imediata. O paciente pode cair devido à fraqueza súbita dos membros inferiores, mas tende a permanecer consciente.

Nos casos em que há perda de consciência, a recuperação não é rápida nem completa. Além disso, se a pessoa acordar com sequelas, como paralisia de um lado do corpo, boca torta, dificuldade para falar ou confusão mental persistente, a causa mais provável não é síncope, mas sim um AVC.

Explicamos os sintomas do AVC em detalhes no artigo: 7 sintomas do AVC / Derrame cerebral.

Sinais de alerta: se uma pessoa desmaia e acorda com sintomas neurológicos, como dificuldade para mover um lado do corpo ou falar, procure atendimento médico imediatamente.

2. Parada cardíaca (morte súbita)

Na parada cardíaca, o coração para de bombear sangue de forma eficaz, interrompendo o fornecimento de oxigênio ao cérebro. Como resultado, o paciente perde a consciência, cai e não responde a estímulos.

Diferente da síncope, na parada cardíaca a pessoa não se recupera espontaneamente e permanece no chão sem sinais vitais. Não há respiração perceptível nem pulso palpável. Se as manobras de reanimação cardiopulmonar (RCP) não for iniciada imediatamente, a evolução natural é o óbito.

Explicamos a morte súbita e suas causas no artigo: Morte súbita: causas em adultos, atletas e bebês.

Sinais de alerta: se alguém desmaia e não responde, não respira e não tem pulso, isso não é um simples desmaio. Deve-se iniciar RCP e chamar o serviço de emergência imediatamente.

3. Crise epiléptica

As crises epilépticas também podem causar perda da consciência e, por isso, podem ser confundidas com desmaios. No entanto, algumas características ajudam a diferenciá-las.

Durante uma crise epiléptica, o paciente pode apresentar movimentos involuntários e rítmicos dos braços e pernas (convulsões), mordida na língua, incontinência urinária ou fecal e um período de confusão mental após recuperar a consciência.

Além disso, a recuperação após uma crise epiléptica costuma ser mais lenta, e o paciente pode ficar desorientado por vários minutos ou horas. Já na síncope, a recuperação é rápida e completa.

Explicamos a epilepsia e a crise convulsiva no artigo: Epilepsia: o que são convulsão, crise atônica, ausência e status epilepticus?

Sinais de alerta: se o paciente acorda desorientado, com mordidas na língua, sinais de incontinência e múltiplos traumas pelo corpo, pode ter ocorrido uma crise epiléptica em vez de um desmaio simples.

4. Transtorno conversivo (antigamente chamado de histeria)

Algumas pessoas podem apresentar episódios de perda aparente da consciência devido a distúrbios psicogênicos, como os transtornos conversivos.

Esses episódios podem ocorrer de forma inconsciente, sem que a pessoa esteja simulando deliberadamente o evento. Diferente da síncope verdadeira, nesse tipo de desmaio não há uma disfunção do fluxo sanguíneo cerebral, e a perda de consciência pode ser prolongada e com características atípicas, como falta de lesões após a queda, ausência de palidez e recuperação gradual.

Sinais de alerta: se o desmaio ocorrer de forma recorrente, sem desencadeantes claros e sem alterações em exames médicos, deve-se considerar causas psicogênicas.

5. Concussão cerebral após traumatismo craniano

Em alguns casos, a pessoa pode sofrer uma síncope verdadeira, mas ao cair, bater a cabeça com força e sofrer um traumatismo craniano. O impacto pode levar a uma concussão cerebral, prolongando a inconsciência e causando sintomas como náusea, vômito, tontura e confusão mental após o evento.

Sinal de alerta: se após um desmaio a pessoa não despertar rapidamente ou apresentar sintomas persistentes, um traumatismo craniano deve ser investigado, especialmente se houver sinais de trauma na região da cabeça.

Nervo vago

Para entender melhor as causas do desmaio, é essencial conhecer um pouco sobre o funcionamento do sistema nervoso autônomo, que regula funções vitais como pressão arterial, frequência cardíaca, respiração e digestão. Esse sistema é dividido em duas partes:

  • Sistema nervoso simpático: atua como um acelerador, aumentando a pressão arterial, a frequência cardíaca e preparando o corpo para situações de estresse ou emergência.
  • Sistema nervoso parassimpático: atua como um freio, reduzindo a pressão arterial e desacelerando os batimentos cardíacos, promovendo relaxamento e equilíbrio corporal.

O nervo vago é um dos principais componentes do sistema nervoso parassimpático. Ele se origina no tronco cerebral e se ramifica por diversos órgãos do corpo, incluindo coração, pulmões, estômago e intestinos. Além de controlar funções como digestão e sudorese, ele também influencia diretamente a pressão arterial e os batimentos cardíacos.

Nervo vago
Nervo vago

Principais causas de desmaios (síncope)

Existem várias causas para o desmaio, que podem variar de situações benignas a doenças graves. Em muitos casos, a síncope é resultado de um reflexo do sistema nervoso autonômico, como ocorre na síncope vasovagal. No entanto, algumas doenças cardíacas e neurológicas também podem estar por trás do problema.

Cerca de 1/3 dos casos de síncope permanecem sem um diagnóstico definitivo, mesmo após avaliação médica detalhada. Embora a maioria das síncopes seja benigna, é essencial investigar cada episódio, pois algumas podem ser sinal de problemas potencialmente fatais.

A seguir, exploramos as principais causas de desmaios clinicamente relevantes.

Síncope vasovagal

O tipo de desmaio mais frequente é aquele causado pela ativação exagerada do nervo vago, um fenômeno chamado síncope vasovagal. Isso ocorre quando um estímulo externo, como medo intenso, dor súbita, calor excessivo ou longos períodos em pé sem se movimentar, provoca uma resposta do sistema parassimpático, resultando em:

  • Dilatação dos vasos sanguíneos: a pressão arterial cai abruptamente.
  • Diminuição da frequência cardíaca: reduz o fluxo sanguíneo ao cérebro.
  • Redução temporária da oxigenação cerebral: causando perda de consciência.

Como resultado, a pessoa desmaia, mas geralmente recupera a consciência rapidamente, pois ao ficar deitada, ela volta a receber fluxo sanguíneo adequado para o cérebro.

Fatores que podem desencadear a síncope vasovagal

A síncope vasovagal pode ser provocada por diversas situações, incluindo:

  • Dor intensa (como ao bater um dedo ou fazer uma tatuagem).
  • Medo ou estresse emocional extremo (por exemplo, ao ver sangue ou injeções).
  • Calor excessivo e desidratação, que reduzem o volume de sangue circulante.
  • Permanecer muito tempo em pé sem se movimentar (como em filas ou em cerimônias).
  • Episódios de tosse intensa, espirros ou evacuações forçadas, que podem estimular o nervo vago.
  • Pressão no pescoço, como ocorre em pessoas com hipersensibilidade do seio carotídeo, onde uma leve massagem na região do pescoço por onde passa o nervo vago pode desencadear um desmaio.

A síncope vasovagal pode ser prevenida?

Em muitos casos, é possível evitar a síncope vasovagal ao identificar os primeiros sinais e tomar medidas preventivas:

Sintomas prévios ao desmaio (pródromos):

  • Sensação de calor e suor frio.
  • Palidez e tontura.
  • Escurecimento da visão.
  • Náusea e sensação de fraqueza.

O que fazer ao perceber os sintomas?

  • Sentar-se ou deitar-se imediatamente, elevando as pernas.
  • Respirar profundamente para melhorar a oxigenação.
  • Se possível, afastar-se de ambientes quentes e abafados.

A síncope vasovagal é, na maioria dos casos, benigna e autolimitada. No entanto, se os episódios forem recorrentes ou ocorrerem sem motivo aparente, é importante procurar avaliação médica para descartar outras causas mais graves.

Hipotensão postural (ortostática)

A hipotensão postural, também chamada de hipotensão ortostática, ocorre quando há uma queda abrupta da pressão arterial ao mudar de posição — geralmente ao passar da posição deitada ou sentada para a posição em pé. Essa redução temporária do fluxo sanguíneo cerebral pode causar tontura, visão turva e, em alguns casos, síncope.

Por que a hipotensão postural surge?

Normalmente, quando nos levantamos, o sistema cardiovascular reage rapidamente para manter a pressão arterial e garantir um fluxo sanguíneo adequado ao cérebro. Isso é feito através de reflexos autonômicos, que incluem:

  • Contração dos vasos sanguíneos nas pernas e abdômen para evitar acúmulo de sangue.
  • Aumento da frequência cardíaca para manter o débito cardíaco.
  • Aumento da pressão arterial para compensar a gravidade.

Na hipotensão ortostática, esses mecanismos falham ou demoram a ocorrer, permitindo que o sangue se acumule nas pernas e reduzindo temporariamente a perfusão cerebral. Isso leva à tontura e, em casos mais extremos, ao desmaio.

Fatores de risco para hipotensão postural

A hipotensão postural pode ser mais comum em determinadas condições, como:

  • Desidratação: redução do volume sanguíneo pode tornar o organismo mais vulnerável à queda de pressão.
  • Uso de medicamentos: especialmente diuréticos, anti-hipertensivos, antidepressivos, betabloqueadores e vasodilatadores.
  • Idosos: o reflexo autonômico se torna menos eficiente com o envelhecimento, aumentando o risco de quedas e síncopes.
  • Diabetes: a neuropatia autonômica, comum nos pacientes com diabetes de longa data, pode prejudicar a resposta do organismo às mudanças posturais.
  • Doenças neurológicas: a doença de Parkinson e atrofia de múltiplos sistemas podem afetar o controle da pressão arterial.
  • Anemia grave: a baixa quantidade de hemoglobina reduz a oxigenação do cérebro.
  • Consumo excessivo de álcool: pode levar à vasodilatação e queda da pressão arterial ao se levantar.

Sintomas da hipotensão postural

Os sintomas geralmente ocorrem segundos ou minutos após se levantar e podem incluir:

  • Tontura ou sensação de desmaio iminente.
  • Visão turva ou escurecimento da visão.
  • Fadiga ou sensação de fraqueza repentina.
  • Náusea leve.
  • Confusão mental transitória.
  • Queda com perda de consciência (em casos mais graves).

Diagnóstico da hipotensão ortostática

O diagnóstico pode ser feito através de medição da pressão arterial em duas posições:

  1. Deitado por 5 minutos.
  2. Em pé imediatamente e após 1, 3 e 5 minutos.

Se houver uma queda de pelo menos 20 mmHg na pressão sistólica ou 10 mmHg na pressão diastólica dentro de 3 minutos após se levantar, o diagnóstico de hipotensão ortostática é confirmado.

Em alguns casos, testes mais detalhados podem ser necessários, como o teste da inclinação (Tilt Test), usado para avaliar a resposta autonômica em pacientes com síncopes frequentes.

Arritmias cardíacas

As arritmias cardíacas são alterações no ritmo do coração que podem interferir no bombeamento do sangue para o cérebro, levando a episódios de síncope.

Quando o coração bate muito devagar (bradicardia) ou muito rápido (taquicardia), ele pode não fornecer oxigenação cerebral suficiente, resultando em perda súbita da consciência.

Características da síncope de origem cardíaca:

  • Desmaio repentino, sem sintomas prévios.
  • Pode ocorrer durante atividades físicas ou em repouso.
  • Histórico de palpitações ou tonturas frequentes.
  • Alto risco de parada cardíaca em alguns casos.

Principais arritmias associadas à síncope:

  • Bradicardia extrema (coração bate muito devagar).
  • Taquicardia ventricular (coração bate muito rápido e de forma irregular).
  • Síndrome do QT longo (predisposição a arritmias fatais).
  • Síndrome de Brugada (condição genética associada à morte súbita).

Diagnóstico e tratamento

O diagnóstico pode ser feito com eletrocardiograma (ECG), Holter 24h ou teste de esforço. Em casos graves, pode ser necessária a implantação de um marcapasso (para bradicardias) ou um desfibrilador implantável (CDI) para evitar arritmias fatais.

Leitura sugerida: Palpitação no coração: taquicardia e arritmias cardíacas.

Doenças cardíacas estruturais

Além das arritmias cardíacas, algumas alterações estruturais no coração podem comprometer o fluxo sanguíneo e levar à síncope. Essas doenças dificultam a ejeção adequada do sangue para o corpo e para o cérebro, reduzindo temporariamente a oxigenação cerebral e causando desmaios.

Principais doenças cardíacas estruturais associadas à síncope:

  • Estenose da válvula aórtica (dificulta a saída do sangue do coração).
  • Cardiomiopatia hipertrófica (crescimento anormal do músculo cardíaco).
  • Embolia pulmonar (coágulo nos pulmões que reduz a oxigenação do sangue).
  • Dissecção de aorta (ruptura da parede interna da aorta, levando à redução do fluxo sanguíneo e risco de morte súbita).
  • Tamponamento cardíaco (acúmulo de líquido no pericárdio, dificultando a contração do coração e causando queda grave da pressão arterial).
  • Miocardiopatia dilatada (fraqueza do músculo cardíaco, reduzindo a capacidade do coração de bombear sangue e podendo levar a arritmias e síncope).
  • Doença cardíaca congênita (malformações no coração que afetam o fluxo sanguíneo e a oxigenação, podendo causar desmaios desde a infância ou adolescência).

Hipoglicemia e distúrbios metabólicos

A queda acentuada do açúcar no sangue pode levar a sintomas neurológicos que simulam uma síncope. Isso ocorre especialmente em diabéticos que fazem uso de insulina ou medicamentos hipoglicemiantes.

Sinais típicos da hipoglicemia:

  • Sudorese excessiva.
  • Tremores e tontura.
  • Confusão mental antes da perda da consciência.

Outros distúrbios metabólicos, como anemia grave, desidratação severa e hiperventilação, também podem provocar desmaios em algumas situações.


Referências



Autor(es)

Dr. Pedro Pinheiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.

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