Introdução
Mulheres grávidas podem tomar antibióticos? Existem antibióticos seguros durante a gestação? O que fazer quando a grávida tem uma infecção e precisa de tratamento?
Com o aumento da prevalência das doenças crônicas e a expansão do arsenal de antibióticos para tratar infecções, é cada vez mais comum o uso de remédios durante a gravidez.
Apesar de temida, nem toda medicação tomada durante a gestação é necessariamente perigosa. Em muitas situações, como nos casos de infecções, os medicamentos são necessários para o bem-estar da mãe e do feto. Um caso de infecção urinária na grávida, por exemplo, é muito mais danoso ao feto do que os possíveis efeitos adversos dos antibióticos (leia: Infecção urinária na gravidez).
Não podemos esquecer, porém, que cerca de 3% das malformações fetais ainda são provocadas pelo uso indevido de remédios durante a gravidez, principalmente quando estes são administrados no primeiro trimestre, fase em que o feto está em formação.
Neste artigo vamos fazer uma rápida revisão sobre os benefícios e os perigos do uso de antibióticos na gravidez.
Antibióticos fazem mal?
Antes de falarmos especificamente da prescrição de antibióticos na gravidez, é preciso primeiro derrubar alguns mitos acerca do uso dos antibióticos em geral.
O advento dos antibióticos foi uma das maiores revoluções da humanidade. Doenças que vitimaram milhões de pessoas ao longo dos séculos passaram a ser facilmente controladas com um tratamento que consiste, em muitos casos, na tomada de comprimidos durante 7 ou 10 dias.
Hoje em dia ninguém mais se preocupa com uma epidemia de peste bubônica e doenças potencialmente fatais, como a sífilis e a tuberculose, apesar de ainda serem frequentes, apresentam uma taxa de mortalidade drasticamente menor do que no início do século XX.
Antibióticos são, por princípio, drogas extremamente benéficas à população. O problema com os antibióticos surge quando o seu uso é feito de forma indiscriminada ou pouco criteriosa. Assim como qualquer remédio, os antibióticos só devem ser prescritos quando há uma clara indicação.
Para prescrever um antibiótico, o médico precisa conhecer o seu espectro de ação antimicrobiano, os seus mecanismos de ação, o seu perfil de efeitos adversos, as suas contraindicações e o perfil de resistência microbiana da sua comunidade. Se forem respeitados rodos os cuidados, os antibióticos trarão muito mais benefícios que malefícios aos pacientes.
Nos casos das grávidas, o médico precisa saber também quais são os antibióticos seguros para o desenvolvimento do feto. Existem antibióticos que podem ser utilizados com segurança em qualquer momento da gravidez, mas existem também aqueles que são comprovadamente danosos para o feto.
Caso sejam seguidas as orientações, não é preciso ter medo de tomar antibióticos durante a gravidez. Muitos dos antibióticos permitidos na gestação já são usados há décadas sem que tenham sido identificados graves problemas de malformação.
Para saber um pouco mais sobre os antibióticos em geral, acesso o seguinte link: ANTIBIÓTICOS | Tipos, resistência e indicações
Classificação dos medicamentos durante a gravidez
Assim como qualquer outra droga, os antibióticos também recebem uma classificação de acordo com o seu potencial risco para o feto. A forma mais comum de classificar a segurança das drogas em relação à gestação é através da classificação do FDA, agência americana de medicamentos:
- Categoria A → medicamentos adequadamente estudados em humanos, que não revelam problemas no primeiro trimestre de gravidez e não há evidências de problemas nos segundo e terceiro trimestres.
- Categoria B → medicamentos sem estudos adequados em humanos, mas que a experiência em animais não demonstrou riscos OU medicamentos com efeitos adversos em animais, mas que, quando estudados em humanos, não demonstram riscos.
- Categoria C → medicamentos sem estudos adequados em humanos, mas que a experiência em animais demonstrou riscos para o feto. Nestes casos, potenciais efeitos benéficos do tratamento podem ser maiores que os riscos, justificando o seu uso na gestação em situações específicas.
- Categoria D → medicamentos com estudos adequados em humanos que demonstram evidências de risco para o feto. Só devem ser indicados na gravidez nos casos de doenças graves para as quais não se possa utilizar drogas mais seguras.
- Categoria X → medicamentos com estudos adequados em humanos que demonstram anormalidades no feto. Não usar em hipótese alguma durante a gravidez.
Existem várias outras formas de classificar o risco fetal dos medicamentos, a tabela do FDA foi escolhida neste artigo por ser uma das mais comuns e simples.
Antibióticos durante a gestação
Vamos listar alfabeticamente os principais antibióticos e a sua respectiva classificação de risco. Quando necessário, farei algumas observações.
Para facilitar o entendimento, saiba que os medicamentos que se enquadram nas categorias A e B são aqueles habitualmente usados na gravidez. No caso dos antibióticos, não há drogas classificadas na categoria A. Os antibióticos usados nas grávidas são aqueles da categoria B, mas isso não é um problema, pois não se espera que esses fármacos provoquem problemas no feto.
Medicamentos da categoria C são eventualmente usados, em geral, em situações específicas, quando a droga é necessária e não existem alternativas na categoria A e B.
Medicamentos classificados como categoria D são contraindicados na gravidez, e o seu uso só é aceito em situações extremas, quando a infecção é de alto risco para o feto e não há drogas mais seguras disponíveis. Em situações normais não é aceitável a prescrição de um antibiótico da categoria D para grávidas.
Os medicamentos classificados como categoria X são aqueles que comprovadamente provocam malformações e em nenhuma situação a sua prescrição é aceita.
Lista de antibióticos – categoria de risco na gravidez
- Amicacina – Categoria D
- Amoxicilina – Categoria B
- Amoxicilina + ácido clavulânico – Categoria B
- Azitromicina – Categoria B
- Cefalotina – Categoria B
- Cefazolina – Categoria B
- Ceftriaxona – Categoria B
- Cefuroxima – Categoria B
- Ciprofloxacino – Categoria C
- Claritromicina – Categoria C
- Clindamicina – Categoria B
- Cloranfenicol – Categoria C
- Doxiciclina – Categoria D
- Eritromicina – Categoria B
- Estreptomicina – Categoria D
- Fosfomicina – Categoria B
- Gentamicina – Categoria D
- Levofloxacino – Categoria C
- Metronidazol – Categoria B*
- Minociclina – Categoria D
- Neomicina – Categoria D
- Nitrofurantoína – Categoria B**
- Norfloxacina – Categoria C
- Ofloxacina – Categoria C
- Oxacilina – Categoria B
- Penicilina benzatina – Categoria B
- Penicilina V – Categoria B
- Piperacilina + Tazobactam – Categoria B
- Primaquina – Categoria C
- Rifampicina – Categoria C
- Sulfametoxazol + Trimetoprim – Categoria D***
- Tetraciclina – Categoria D
- Tobramicina – Categoria D
- Vancomicina – Categoria B
*O metronidazol é contraindicado (categoria X) no primeiro trimestre. A partir do segundo trimestre, ele pode ser usado nas grávidas.
**A nitrofurantoína é contraindicada (categoria X) a partir da 38ª semana de gestação, pois está relacionada a um elevado risco de anemia hemolítica no recém-nascido.
***Em situações especiais, como no tratamento do Pneumocystis jirovecii, na profilaxia da encefalite por toxoplasmose e no tratamento da febre Q, o Sulfametoxazol + trimetoprim pode ser prescrito nas grávidas.
Referências
- Schaefer C, et al., eds. Anti-infective agents. In: Drugs During Pregnancy and Lactation: Treatment Options and Risk Assessment. 3rd ed. Amsterdam, Netherlands: Elsevier B.V.; 2015.
- Briggs, G., Freeman, R. K., & Yaffe, S. J. (2011). Drugs in pregnancy and lactation: A reference guide to fetal and neonatal risk. Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins.
- General drug information – UpToDate.
- Antibiotic chemotherapy during pregnancy and lactation period: aspects for consideration – Archives of gynecology and obstetrics.
- Use of antibiotics during pregnancy and risk of spontaneous abortion – Canadian Medical Association journal.
Autor(es)
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.