O que são os anti-inflamatórios não esteroides?
Os anti-inflamatórios não esteroides (AINE ou AINEs), como o próprio nome diz, fazem parte de uma classe de medicamentos que agem sobre processos inflamatórios no organismo.
Os AINEs são uma das classes de medicamentos mais vendidas no mundo, sendo especialmente eficazes no tratamento das dores de leve a moderada intensidade e nas inflamações, principalmente ao nível osteoarticular.
Todos os anti-inflamatórios apresentam três efeitos básicos:
- Antipirético (abaixa a febre).
- Analgésico (combate a dor).
- Anti-inflamatório (reduz a inflamação).
As diferenças entre os mais de 20 tipos de anti-inflamatórios presentes no mercado costumam estar na potência de cada uma dessas três ações e nos tipos de efeito colaterais.
Neste artigo falaremos sobre os benefícios e os riscos do uso os anti-inflamatórios não esteroides.
Exemplos de anti-inflamatórios não esteroides
Existem dezenas de anti-inflamatórios, alguns exemplos são:
- Diclofenaco (Cataflam®, Voltaren®).
- Ibuprofeno (Advil®, Motrin®).
- Naproxeno (Flanax®, Naprosyn®).
- Nimesulida (Nisulid®, Scaflam®).
- Indometacina (Indocid®).
- Cetoprofeno (Profenid®).
- Ácido mefenâmico (Ponstan®).
- Piroxicam (Feldene®).
- Celecoxibe (Celebra®).
- Etoricoxibe (Arcoxia®).
- Meloxicam (Movatec®).
- Aceclofenaco (Proflam®).
- Ácido acetilsalicílico (AAS®, Aspirina®).
Todos os anti-inflamatórios citados acima são fármacos que apresentam mecanismos de ação semelhantes, mas com particularidades entre cada um deles, como tempo de ação, potenciais interações medicamentosas e seletividade pela COX-1 ou COX-2, que será discutida mais adiante.
Para que servem os anti-inflamatórios?
Em geral, os anti-inflamatórios são medicamentos utilizados como sintomáticos, ou seja, eles aliviam os sintomas, mas não tratam diretamente as doenças que os provocam. Um paciente com faringite, por exemplo, pode tomar AINEs para aliviar a dor de garganta, mas se a causa for uma infecção bacteriana, será necessário também um antibiótico para curar a infecção.
Os AINEs devem ser preferencialmente prescritos para o tratamento de quadros de dor de leve a moderada intensidade e/ou quando há inflamação de origem osteoarticular.
Entre as condições mais indicadas podemos citar:
- Artrite reumatoide.
- Espondilite anquilosante.
- Osteoartrose.
- Dismenorreia (cólica menstrual).
- Gota.
- Amigdalites.
- Enxaqueca.
- Cálculo renal.
- Inflamações odontológicas.
- Tendinites.
- Bursites.
- Lombalgia e outras dores articulares e de coluna.
- Controle da dor no pós-operatório.
- Traumas.
Como agem os anti-inflamatórios?
De forma simplificada, os quadros inflamatórios surgem quando há um aumento da produção de uma substância chamada prostaglandina. A prostaglandina é gerada através da ação de uma enzima chamada ciclooxigenase (COX).
Existem dois principais tipos de COX:
- COX-1, que atua na produção de prostaglandinas que protegem a mucosa do trato gastrointestinal e regulam a função renal.
- COX-2, que é induzida principalmente em processos inflamatórios e está associada à produção de prostaglandinas responsáveis por dor e inflamação.
Os anti-inflamatórios agem inibindo a ação dessa enzima COX. Sem COX, há menor produção de prostaglandinas e menos estímulo para ocorrer inflamações. Como a presença da prostaglandina estimula o surgimento de inflamação, dor e febre, sua inibição pelos AINEs acaba tendo efeito analgésico, antipirético e anti-inflamatório.
O problema é que existem mais de um tipo de prostaglandina e de ciclooxigenase. Nem toda prostaglandina causa inflamação ou febre, e nem toda COX age sobre todos os tipos de prostaglandinas.
Como muitos AINEs inibem tanto a COX-1 quanto a COX-2, não apenas as prostaglandinas “ruins” (que causam dor e inflamação) são reduzidas, mas também as “boas” (que protegem o estômago e os rins, por exemplo). Isso explica vários efeitos colaterais.
Ações da COX no organismo
As COX e as prostaglandinas são responsáveis pelos seguintes efeitos no organismo:
Proteção do estômago contra ácidos produzidos no seu interior
As prostaglandinas agem no estômago inibindo a produção de ácido clorídrico e aumentando a produção do muco que reveste e protege a parede estomacal.
Quando as prostaglandinas são inibidas, o estômago fica mais vulnerável à ação do ácido, aumentando o risco de gastrite e úlceras. Não é por acaso que uma das principais causas de hemorragia digestiva alta é o sangramento de úlceras gástricas ou duodenais provocado pelo uso indiscriminado de AINEs.
Existe uma classe de anti-inflamatórios chamada inibidores seletivos da COX-2, que consegue inibir as prostaglandinas responsáveis pela inflamação sem alterar as que protegem o estômago. O celecoxibe e o etoricoxibe são exemplos de AINEs seletivos que apresentam baixa incidência de lesões gástricas.
Os anti-inflamatórios inibidores seletivos da COX-2 são menos agressivos para o estômago, mas mantêm o perfil de efeitos colaterais para rins e coração, conforme explicamos a seguir.
Fluxo de sangue no rins
As prostaglandinas nos rins aumentam o fluxo de sangue, ajudando a manter a perfusão renal adequada. Em pessoas com rins saudáveis, a ação das prostaglandinas renais é menos relevante, e o uso de AINEs por curtos períodos não costuma provocar grandes problemas.
Entretanto, em pacientes com doenças renais ou com condições que reduzem o fluxo sanguíneo para os rins, como insuficiência cardíaca, desidratação ou cirrose, as prostaglandinas são cruciais para manter a função renal. Nestes casos, o uso de AINEs é contraindicado, pois a inibição das prostaglandinas renais pode agravar a insuficiência renal.
Não existe anti-inflamatório seguro para os rins. Todos eles podem causar lesão renal ou agravar uma lesão renal já existente.
Explicamos a lesão renal provocada por anti-inflamatórios com detalhes no artigo: Anti-inflamatórios fazem mal para os rins.
Coagulação sanguínea
A COX também está envolvida na produção de tromboxano A2, uma substância que promove a agregação plaquetária, facilitando a coagulação sanguínea.
Quando a COX e o tromboxano A2 são inibidos pelos AINEs, a capacidade de agregação das plaquetas é reduzida, diminuindo a coagulação do sangue. Isso pode ser perigoso em pacientes com risco de hemorragia ou que precisam passar por cirurgias, motivo pelo qual os AINEs devem ser suspensos alguns dias antes de operações.
O AAS (ácido acetilsalicílico) é o fármaco dessa classe que apresenta maior efeito antiplaquetário, sendo frequentemente usado para prevenir eventos cardiovasculares, como infarto e AVC. O efeito de “afinar o sangue” é, na verdade, uma descrição popular para a ação antiplaquetária da aspirina.
O AAS em doses baixas, geralmente menores que 300 mg, tem pouco efeito anti-inflamatório, sendo útil apenas como anti-agregante plaquetário.
Outros efeitos colaterais dos anti-inflamatórios
Os AINEs são medicamentos seguros quando administrados com indicação médica. O problema é que eles estão entre os medicamentos mais usados como automedicação, aumentando o risco de efeitos colaterais e interações medicamentosas.
Existem inúmeros efeitos colaterais e interações com outros medicamentos que devem ser considerados antes de tomar um anti-inflamatório.
Alguns dos efeitos adversos mais comuns dos anti-inflamatórios são:
- Dor abdominal, náuseas e vômitos.
- Agravamento da hipertensão.
- Inibição da ação dos diuréticos.
- Agravamento da insuficiência cardíaca.
- Agravamento da função renal.
- Síndrome nefrótica.
- Hepatite medicamentosa.
- Interação com Varfarina.
- Reação alérgica.
- Asma induzida por AINEs
- Perda de audição nos idosos.
- Aumento do risco de doenças cardiovasculares.
- Retenção de líquidos e edema.
Portanto, apesar de ser uma classe de fármacos muito usada e relativamente segura, ela está longe de ser isenta de complicações. O seu consumo sem indicação médica ou por longos períodos pode provocar consequências graves.
Eventos cardiovasculares relacionados aos anti-inflamatórios
Embora os anti-inflamatórios não esteroides sejam eficazes no alívio da dor e da inflamação, é importante estar ciente dos potenciais riscos cardiovasculares associados ao seu uso, especialmente quando utilizados por longos períodos ou em doses elevadas.
Estudos clínicos e epidemiológicos têm demonstrado que o uso de alguns AINEs pode estar associado a um aumento do risco de eventos cardiovasculares graves, como:
- Infarto do miocárdio (ataque cardíaco).
- Acidente vascular cerebral (AVC).
- Trombose arterial.
Esse risco parece ser mais pronunciado com o uso de AINEs inibidores seletivos da COX-2, como o celecoxibe e o etoricoxibe. No entanto, AINEs não seletivos, como diclofenaco e ibuprofeno, também podem aumentar o risco cardiovascular, especialmente em doses altas e uso prolongado.
Quem está em maior risco?
- Pacientes com doença cardiovascular pré-existente, como doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, histórico de infarto ou AVC.
- Indivíduos com fatores de risco cardiovascular, como hipertensão, diabetes, colesterol alto, tabagismo e obesidade.
- Idosos, que geralmente têm maior predisposição a problemas cardíacos.
- Pacientes que utilizam AINEs em doses elevadas ou por longos períodos.
Recomendações para reduzir o risco de eventos cardiovasculares:
- Utilizar a menor dose eficaz pelo menor tempo possível para controlar os sintomas.
- Evitar o uso de AINEs inibidores seletivos da COX-2 em pacientes com alto risco cardiovascular.
- Consultar um médico antes de iniciar o uso de AINEs, especialmente se houver histórico de doenças cardíacas ou fatores de risco.
- Monitorar a pressão arterial regularmente durante o uso de AINEs, já que podem elevar a pressão em alguns pacientes.
- Considerar alternativas terapêuticas, como o paracetamol, para controle da dor quando apropriado.
Pacientes que não devem tomar anti-inflamatórios sem orientação médica
Pelo potencial de efeitos adversos, os anti-inflamatórios devem ser usados com precaução, especialmente por indivíduos que fazem parte dos seguintes grupos de risco:
- Idosos.
- Grávidas.
- Pacientes com insuficiência renal.
- Pacientes com cirrose.
- Pacientes com hipertensão descontrolada.
- Pacientes com insuficiência cardíaca.
- Pessoas que consomem, em média, mais de 3 doses de álcool por dia.
- Pacientes medicados com varfarina.
- Pacientes com risco de hemorragia.
- História de úlcera péptica ou gastrite.
Referências
- What Are NSAIDs? – American Academy of Orthopaedic Surgeons.
- A turbulent decade for NSAIDs: update on current concepts of classification, epidemiology, comparative efficacy, and toxicity –
Rheumatology international. - The Benefits and Risks of Pain Relievers: Q & A on NSAIDs – FDA.
- NSAIDs: Therapeutic use and variability of response in adults – UpToDate.
- Nonselective NSAIDs: Overview of adverse effects – UpToDate.
- NSAIDs: Pharmacology and mechanism of action – UpToDate.
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